domingo, 1 de julho de 2012

Lançamento do livro: As artes plásticas na formação do professor - uma perspectiva interdisciplinar

Estudo da pintura de Vermeer "Moça com brinco de pérola", no Atelier Vermeer, Paris, 2011
Na próxima quarta-feira, dia 4 de julho, a partir das 19 horas, estarei fazendo o lançamento do meu livro As artes plásticas na formação do professor, uma perspectiva interdisciplinar. Todos estão convidados a comparecer na Livraria do Espaço Unibanco de Cinema, à Rua Augusta, 1475, São Paulo.


Este livro surgiu de uma ideia do meu amigo e poeta Jeosafá Gonçalves, educador e consultor de diversas editoras, de transformar textos e artigos publicados neste blog e em alguns portais e revistas, num formato de livro de apoio à formação do professor.

Essa possibilidade me mobilizou a vasculhar, entre os meus escritos, aqueles que podiam formatar um livro que fosse útil para quem quisesse saber um pouco mais sobre arte. Jeosafá me ajudou nessa escolha, e a organização dos textos em livros e capítulos passou por suas mãos, experimentadas em preparar livros de apoio a professores.

Mas esse livro, na verdade, pode servir a qualquer pessoa que queira conhecer um pouco mais sobre o mundo fascinante e encantador das artes plásticas. É fruto de vários anos de estudo e pesquisa da teoria e da história da arte, do ponto de vista de uma artista figurativa, que insiste em permanecer imersa dentro da linhagem dos mestres da pintura com viés realista.

Vale salientar que participar de um Atelier de Arte Realista aqui em São Paulo, sob a orientação do pintor Maurício Takiguthi, tem sido fundamental para guiar meus estudos teóricos e práticos tendo como foco a obra de grandes mestres da pintura universal, que vem desde Ticiano, Rafael, Caravaggio, Rembrandt, Velázquez, Vermeer... Ser parte dessa visão teórica e plástica é um exercício diário de resistência ao canto da sereia que poderia nos impelir a prescindir do exercício muitas vezes extenuante da técnica, da busca do nosso próprio aperfeiçoamento, em prol da mesmice e do pragmatismo dos dias atuais.

Vale também dizer que um outro grupo do qual faço parte, em torno do Cineclube Baixa-Augusta, que reúne artistas, cineastas e intelectuais, tem enriquecido muito as minhas reflexões, após muitas discussões, estudos e conversas de alto nível, focadas no mundo cultural contemporâneo.

Assim como minha formação humanista não me deixa esquecer que meu desejo por um mundo justo e solidário é também parte do meu impulso criativo. Do fundo da minha alma parte uma vontade enorme de ser grande, e que sempre me leva a buscar a vida em grupo, a formação coletiva que me leve para mais perto de um futuro igual para todos.

Então este livro também pode ser visto como a minha forma pessoal de ver esse mundo que nos maravilha, que é o mundo da Arte, que aproxima os seres humanos uns dos outros no tempo e no espaço. Enquanto vamos estudando a história da arte, desde tempos remotíssimos, vamos percebendo que a realidade objetiva vai impulsionando ideias, movimentos, sistemas. E que o artista, imerso em seu mundo em mudança, vai criando sua própria narrativa, descrevendo sua visão pessoal das coisas e muitas vezes sendo parte de profundas mudanças de rumo. O historiador da arte alemão Heinrich Wölflin dá um exemplo: Rafael, enquanto pintava a Stanza d’Eliodoro em Roma, entre 1512 e 1514, estava rompendo, aos olhos do mundo, com o modo plástico de ver as coisas de forma linear, inaugurando a fase pictórica em que as massas de cores rompiam os espaços, criando mais relações entre as cores, figuras e efeitos do quadro. Simultaneamente, a ciência se desenvolvia, assim como o capitalismo, a filosofia, a literatura, o teatro, a música.


O livro também traz algumas entrevistas e textos com pintores da atualidade: Maurício Takiguthi, Rubens Ianelli, Tereza Costa Rêgo, Edíria Carneiro. Assim como faço uma visita a importantes artistas plásticos europeus, americanos – inclusive brasileiros – e orientais. Dos clássicos aos contemporâneos, o leitor tem em mãos aspectos biográficos, estéticos e mesmo filosóficos mobilizados por esses artistas para expressar seu tempo, ou negá-lo.

Em todos os capítulos deste livro, a arte, a história e a sociedade se encontram e se revezam em ênfases sutis e articuladas, sob as quais jazem miríades de possibilidades de trabalho, seja em sala de aula, no caso dos professores, ou fora dela, no caso do leitor comum.

Um pouco sobre mim: desde 1979 venho me dedicando ao aprendizado desse mundo do desenho e da pintura, mas não de forma linear. Altos e baixos passaram por mim, nesses últimos 30 anos. Passei por escolas de arte diversas, entre as quais a Sociedade Brasileira de Belas Artes no Rio de Janeiro. Hoje estudo pintura com Maurício Takiguthi. Sou também bacharel em Letras pela Universidade de São Paulo, e faço pesquisa em teoria e história da Arte. Fiz parte de um workshop de pintura no Atelier Vermeer de Paris. Visitei dezenas de museus em diversos países, como Espanha, Portugal, França, Holanda, Alemanha, Polônia, Brasil e Argentina, com finalidade de pesquisa. Desde 2009, mantenho este blog onde escrevo minhas ideias e estudos sobre artes plásticas, assim como colaboro com textos sobre o mesmo tema para diversas revistas e sites.

Para terminar, enquanto consciente de estar dando um passo arriscado, como é publicar um livro, lembro Clarice Lispector:

“Repito por pura alegria de viver:
a salvação é pelo risco,
sem o qual a vida não vale a pena!”




sexta-feira, 29 de junho de 2012

Murillo, o pintor realista de Sevilha

Murillo: A sagrada família do passarinho, 1645-1650
O Museu do Prado de Madri tem apresentado uma programação rica em grandes exposições. Neste momento, além da mostra “O jovem Rafael” (leia aqui), o Museu traz a exposição intitulada “Murillo e Justino de Neve. A arte da amizade” que apresenta um conjunto de dezessete obras da fase mais tardia do artista. Esses quadros pertencem a coleções de museus de Londres, Paris, Houston, Madrid e Sevilha, entre outras cidades.

O Museu do Prado de Madri reúne um acervo de pintura dos mais importantes da Europa, mais especialmente de pintores espanhóis cujos nomes simbolizam o que há de melhor na pintura universal, como Diego Velásquez, Francisco Goya, José Ribera e Murillo entre outros. Sem esquecer que Salvador Dali e Pablo Picasso também eram espanhóis.



Murillo: Autorretrato, 1670, óleo sobre tela
O conjunto dos quadros, segundo o portal do Museu, são “um excelente testemunho de alguns dos projetos artísticos mais importantes que aconteceram em Sevilha naquele período, que coloca o espectador dentro do coração do Barroco sevilhano e sua fusão entre arte, religiosidade e cultura”.

Além de obras que pertenceram a Justino de Neve, um cônego da igreja de Sevilha, Murillo também fez pinturas para a igreja de Santa Maria La Blanca, para a catedral e para o Hospital dos Veneráveis Sacerdotes.

Justino de Neve, além de amigo de Murillo, foi seu mecenas em algumas das pinturas mais importantes, como por exemplo as da Fundação de Santa Maria Maior, três dos quais foram restaurados para esta exposição. Também estão lá na mostra a Alegoria da primavera (A florista), e O verão, entre outras.

Justino de Neve adquiriu em sua vida pelo menos 18 quadros de Murillo, entre os quais seu retrato, executado pelo pintor. Inspirado em artistas italianos e em Van Dyck, Murillo retratou Justino de Neve com elegância e grandeza.

Murillo: retrato de Dom Justino de Neve,
óleo sobre tela
Quando estive em Paris, em 2011, pude ver de perto “O pequeno mendigo” de Murillo, justamente quando um copista do Museu do Louvre pintava uma cópia dele. Murillo possuía especial sensibilidade para pintar crianças, e nessa mostra atual em Madri, pode-se apreciar seu “São João menino com um cordeiro”, que também tinha pertencido a Justino de Neve.

Há também um autorretrato de Murillo e, segundo o texto que apresenta a exposição, é “junto ao de Velázquez em ‘As Meninas’, um dos mais sofisticados e influentes retratos de artistas da Espanha do século XVII.”

Breve biografia

Bartolomé Esteban Murillo nasceu em Sevilha (Espanha) em 1617 e faleceu a 3 de abril de 1682. Foi um pintor barroco espanhol, figurando ao lado de outros grandes mestres: Caravaggio, Rubens, Rembrandt, Vermeer e Zurbarán.

Com uma característica realista, Murillo estava imerso dentro da fase plena do Barroco, mas alguns críticos dizem que ele poderia já ser um prenúncio do futuro estilo rococó, praticado pelo francês Fragonard, muito mais tarde.

Figura central da escola de pintura de Sevilha, Murillo teve muitos discípulos e seguidores de seu estilo, levando sua influência até o século XVIII. Ele foi também o pintor espanhol melhor conhecido e mais apreciado fora de seu país, no mesmo período.

Murillo: Pequeno camponês sorrindo
no parapeito, óleo sobre tela
Murillo foi o mais novo filho de uma família de 14 irmãos. Seu pai, Gaspar Esteban, era um próspero barbeiro, que também era cirurgião, dono de alguns imóveis que foram fontes de rendas para Murillo após a morte do pai. Sua mãe, María Pérez Murillo, era de uma família de ourives e de pintores. Bartolomé acabou adotando o sobrenome da mãe em seu nome. Seus pais morreram quando ele tinha pouco mais de nove anos de idade. Sua irmã mais velha, Ana, foi quem cuidou dele desde então.

As notícias sobre seus primeiros anos de vida e sua formação como pintor são escassas. Mas admite-se que ele tivesse passado pelo ateliê do pintor Juan del Castillo, parente de sua mãe. A influência de Castillo pode ser notada na expressão amigável dos rostos das pinturas de Murillo de sua primeira fase, que era também uma característica de seu mestre.


Em 1645 ele pintou treze quadros para o Convento de São Francisco, em Sevilha, onde se poderia notar, agora, uma influência de Van Dyck, Ticiano e Rubens. O sucesso desta encomenda foi tal que logo vieram outras.

No mesmo ano, Murillo se casou com Beatriz Cabrera y Villalobos, com quem teve nove filhos. Na peste de 1649, que assolou a cidade de Sevilha, quatro de seus filhos morreram. Mas mesmo com a peste, ele continuou a receber encomendas.

Murillo: O pequeno São João,
óleo sobre tela
Em 1658, Murillo foi para Madrid, onde conheceu os pintores Diego Velázquez, Francisco de Zurbarán e Alonso Cano. Nessa época, diversos bons pintores moravam em Madrid. Lá também ele conheceu a pintura flamenga e veneziana.

Mas alguns meses depois, voltou para sua terra natal. Seu reconhecimento aumentava, assim como as encomendas, lhe permitindo ter uma vida tranqüila com sua família. Contribuíam para isso as propriedades deixadas por seus pais como herança.

Em 1663 Beatriz morreu em mais um parto.

A partir de 1665, sua produtividade foi ainda maior, pois as encomendas não só continuavam como aumentavam. Assim como sua fama, fazendo de Murillo um pintor conhecido em todo o seu país. O rei Carlos II convidou Murillo a estabelecer-se em Madrid.

Em 1681 recebeu como encomenda pintar os retábulos da igreja do Convento de Santa Catalina de Cádiz. Foi aí, enquanto trabalhava, que sofreu uma grave queda, resultando em sua morte, alguns meses mais tarde, já em 1682. Seu funeral foi pleno de honrarias, e ele foi enterrado como uma pessoa muito admirada por seu povo, como também aconteceu com o pintor italiano Rafael, ao qual nos referimos anteriormente neste blog (leia aqui).

Murillo, assim como os mestres do barroco Caravaggio, Velázquez e Rembrandt, entre outros, davam um tom realista a suas pinturas. Em seus quadros, as figuras são inspiradas em modelos reais, em pessoas comuns. E em estilo pictórico, modelo inaugurado por Rafael Sanzio (1483-1520), enquanto pintava a Stanza d’Eliodoro, como ressalta Heinrich Wöllflin em Conceitos Fundamentais de História da Arte. Na sequência, ao final do século XVI, surge Caravaggio, o grande mestre do Barroco, pintor também realista, fascinado pelos efeitos da luz, que ele pintou como ninguém. E inspirou tantos outros mestres após ele, como os espanhóis Velázquez, Zurbaran, Ribera e Murillo.



Murillo: Alegoria da Primavera (A Florista), Óleo sobre tela, 1665-1670

domingo, 24 de junho de 2012

Vincent Van Gogh: seus quadros resultam de muito estudo


Detalhe de um de seus autorretratos
Vincent van Gogh, pintor holandês nascido em 30 de março de 1853 (leia mais aqui), escreveu mais de 700 cartas a seu irmão mais novo, Theo, que era negociante de arte nos Países Baixos e foi um apoio fundamental para seu irmão artista. Theo van Gogh apoiou não só financeiramente a Vincent, mas era muito presente na vida do irmão mais velho, dando apoio emocional e incentivo em sua carreira de artista. Diz-se que os dois eram tão unidos que no ano seguinte à morte de Vincent, Theo também morreu.
Mas o tema que nos interessa no momento, dentro das cartas de Vincent a Theo, é apontar como Vincent van Gogh era um estudioso de sua profissão de artista. Acho importante enfatizar isso, pois vivemos em um tempo em que o sistema artístico hegemônico atual considera que técnica não serve para nada e que o aluno não precisa mais se debruçar dias e dias, anos de sua vida, no estudo da técnica e da teoria. Prega-se a instantaneidade, a rapidez das coisas. E “gênios” são fabricados a partir daí, com todo o apoio da mídia. Hoje em dia, basta ter uma boa ideia, à moda da “Caninha 51”, como aponta Ferreira Gullar.
Terraço do café à noite, Arles, 1888
Mas os mestres, todos, estudaram muito para produzir arte. Se olhamos para um quadro com as cores vivas de Van Gogh, que não nos iludamos: aquilo ali é fruto de aplicação ao estudo, ao desenho, às anotações, à observação das cores, de como elas se comportam em um quadro, umas em relação às outras. E respeitava aqueles que vieram antes dele, sabendo que ele só alcançaria algum status nas artes se soubesse em que terreno pisava, se conhecesse o que falaram e fizeram os que vieram antes dele. Mesmo que fosse para inovar. E Van Gogh o fez.
Extraio aqui alguns trechos de cartas escritas por Vincent a Theo entre 1883 e 1885, no que diz respeito às cores. Há muito mais nesse livro, que recomendo a leitura aos interessados. Esses excertos abaixo foram retirados do livro da Editora L&PM Cartas a Theo, de 2010:
“Escrevo-lhe a respeito de uma passagem de Os artistas do meu tempo, de Charles Blanc: 


‘Três meses aproximadamente antes da morte de Eugène Delacroix, nós o reencontramos, Paul Chenavard e eu, nas galerias do Palais-Royal, às dez horas da noite. Foi à saída de um grande jantar onde se havia discutido questões de arte, e a conversação sobre este mesmo assunto tinha se prolongado entre nós dois, com aquela vivacidade, aquele calor que dispensamos sobretudo às discussões inúteis. Falávamos sobre a cor, e eu dizia:
- ‘Para mim os grandes coloristas são aqueles que não pintam a cor local’. E eu ia desenvolver meu tema quando percebemos Eugène Delacroix na galeria da Rotunda.
‘Ele veio a nós exclamando: tenho certeza de que eles estão discutindo pintura! Com efeito, disse-lhe eu (...), eu dizia que os grandes coloristas não pintam a cor local, e convosco certamente não precisarei ir além.  
‘Eugène Delacroix deu dois passos para trás piscando um olho segundo seu hábito: ‘Isto é perfeitamente verdadeiro, disse ele, veja um tom, por exemplo (e indicava com o dedo o tom cinza e sujo do chão): pois bem, se disséssemos a Paolo Veronese (pintor italiano do Renascimento): pinte-me uma bela mulher loira cuja pele tenha este tom, ele a pintaria, e a mulher seria uma loira em seu quadro’.
A noite estrelada sobre o rio Rhone, 1888
Van Gogh continua:
“A respeito de ‘cores pobres’, não se deve, no meu entender, considerar as cores de um quadro por si mesmas; uma ‘cor pobre’ pode muito bem exprimir o verde tênue e vigoroso de uma campina ou de um trigal quando, por exemplo, estiver sustentada por um castanho-vermelho, um azul-escuro ou um verde-oliva."
“(...) Uma cor escura pode parecer, ou melhor, produzir claridade; isto no fundo é mais uma questão de tom."
 “Mas, então, no que diz respeito à cor propriamente dita, um vermelho-cinza, relativamente pouco vermelho, parecerá mais ou menos vermelho em função das cores que lhe dão vizinhança."
“Assim como o azul e o amarelo. Basta colocar um pouquinho de amarelo numa cor para fazê-la tornar-se muito amarela, quando colocamos esta cor num – ou ao lado de um – violeta ou lilás."
Autorretrato, 1888
“Lembro-me como alguém se esforçava em reproduzir um telhado vermelho sobre o qual batia a luz, por meio do vermelhão e do amarelo-cromo, etc... Não funcionava."
(...) “Li com muito prazer Os mestres de outrora, de Fromentin. Vi tratadas nesse livro , em diversas passagens, as mesmas questões que me preocupavam muito nestes últimos tempos e nos quais penso continuamente... (...)”
“Faz muito tempo, Theo, que estou desgostoso com certos pintores atuais, que nos privam do bistre e do betume*, com os quais se pintaram tantas coisas magníficas e que, bem utilizados, dão sabor, riqueza e generosidade ao colorido, sendo sempre tão distintos. E que possuem propriedades tão notáveis e específicas.”
 “Aliás, também exigem esforço para que se aprenda a utilizá-los, pois deve-se usá-los de forma diferente que as cores ordinárias, e acho muito provável que mais de uma pessoa tenha ficado assustada com as tentativas que é preciso fazer no início e que, naturalmente, não dão certo logo ao primeiro dia em que se começa a utilizá-los.”
Estudo para Marguerite Gachet ao piano, 1890
“(...) Quando encontrar boas obras como, por exemplo, o livro de Fromentin sobre os pintores holandeses, ou se você se lembrar de uma delas (obras), não se esqueça que eu desejo muito que você compre algumas, deduzindo do que você costuma me enviar,desde que tratem de técnica. Tenho a intenção de aprender seriamente a teoria; não considero isso de forma alguma inútil, e acredito que frequentemente o que sentimos ou o que pressentimos instintivamente torna-se claro e certo quando somos guiados por alguns textos que tenham um real sentido prático."
“Quando ouço dizer que ‘na natureza não há preto’, penso que na realidade o preto também não existe na cor.”
“Sobretudo não se deve cair no erro de acreditar que os coloristas não empregam o preto, pois não é preciso dizer que desde que o preto entre em composição com elementos azuis, vermelhos ou amarelos, estes tornam-se cinzas, seja vermelho-escuro, amarelo ou azul-cinzento. Acho especialmente muito interessante o que Charles Blanc no Os Artistas de meu tempo diz sobre a técnica de Velázquez, cujas sombras e semitons consistem, na maioria das vezes, em cinzas frios e incolores, em que o preto e um pouco de branco são os elementos de base. Neste meio neutro e incolor, a menor nuvenzinha, por exemplo, já é muito expressiva.”
E mais à frente:
“(...) Sei entretanto e muito bem quem são os artistas verdadeiros e originais em torno dos quais girarão, como ao redor de um eixo, os paisagistas e os pintores de camponeses. Delacroix, Millet, Corot e o resto. Isto é o que eu sinto, embora mal expresso.”
“Quero dizer com isto que, mais que as pessoas, existem regras, princípios ou verdades fundamentais, tanto para o desenho quanto para a cor, aos quais é preciso recorrer quando se encontra algo de verdadeiro.”
“(...) Quero portanto assegurar a Portier nesta carta que minha crença em Eugène Delacroix e nestas pessoas antigas é muito exata e correta.”
“E enquanto trabalho num quadro em que não se veem claridades de uma lâmpada (...) talvez não seja inútil observar que uma das coisas mais belas dos pintores do nosso século foi pintar a obscuridade, que apesar de tudo é cor.”
“... Como é correto e verdadeiro. E como é importante poder fazer em sua palheta essas cores que não sabemos como chamar e que formam a base de tudo.”
Os comedores de batata, 1885
 -------
* Bistre – bistre é uma tonalidade marrom escuro acinzentado com tom amarelado, feito a partir de fuligem.  Muitos mestres antigos usaram o bistre para seus desenhos. Betume – decomposição de origem animal ou vegetal, de cor escura como o petróleo, serve de base também para a pintura, usando-se por exemplo para dar impressão de envelhecimento a alguma base.
--------
Se quiser mais informações sobre o pintor, acesse o site do Museu Van Gogh de Amsterdam, Holanda:


Van Gogh Museum - em espanhol