quarta-feira, 29 de setembro de 2010

“Liberte os urubu!” da Bienal do espetáculo


A 29ª Bienal de Artes de São Paulo foi inaugurada no último dia 25/09, com mais de 800 trabalhos de 148 participantes. Dias antes de sua abertura, já freqüentava as páginas dos jornais e os noticiários televisivos, transformando-se no que gosta de ser: um espetáculo.

Antes de qualquer coisa, vamos narrar três fatos ocorridos nestes últimos quinze dias, cujo centro é a Bienal:

1 - a OAB-SP oficiou um parecer junto ao Ministério Público solicitando que as obras do artista Gil Vicente fossem retiradas da exposição por incitação ao crime. São desenhos realizados entre 2005 e 2010, onde o autor aparece com um revólver ameaçando figuras políticas nacionais e internacionais, incluindo o papa. Curadores e autor protestaram.

2 - o argentino Roberto Jacoby teve suas duas obras retiradas da mostra, por solicitação do Tribunal Regional Eleitoral, por serem consideradas propaganda eleitoral. Ocorre que o argentino colocou duas fotos gigantescas de um carrancudo Serra e uma empolgante Dilma vestida com trajes coloridos. Autor protestou, curadores apoiaram o TRE.

3 - No dia da inauguração, um garoto com um spray, ao final do dia, sorrateiramente rasgou a tela protetora de uma instalação de Nuno Ramos, que mantém três urubus vivos dentro de um viveiro no vão central do prédio. O rapaz invadiu aquele espaço e escreveu simplesmente: “Liberte os urubu!” (sic) Logo em seguida uma confusão se armou e algumas pessoas, entre elas o pichador, foram parar na delegacia. A Bienal encerrou a visita do dia antes da hora, e a curadoria da Fundação Bienal emitiu uma “nota de repúdio” contra o ato de Rafael Pixobom, nome do rapaz.

O que significa tudo isso? Vamos recordar um pouco da história da Bienal.

Em 1951, o Museu de Arte Moderna de São Paulo lança a I Bienal Internacional de Arte da América Latina com 1.800 obras de 20 países. A ideia, presente nas artes desde o começo do século em Paris e em Moscou, era modernizar as artes plásticas, ideia esta que se multiplicou em todos os ismos dos movimentos modernistas mundo a fora. Nas primeiras bienais de arte de São Paulo, artistas de renome internacional foram apresentados ao público brasileiro: Pablo Picasso (trazendo em 1953 a sua obra “Guernica”), René Magritte, George Groz, Paul Klee, Mondrian, Jackson Pollock, os expressionistas alemães, e mesmo artistas como Van Gogh. Dos artistas nacionais destacaram-se Portinari, Alfredo Volpi, Di Cavalcanti, Lívio Abramo, Tarsila do Amaral, etc. Impossível citar todos os grandes artistas que expuseram suas obras nas Bienais do passado.

Pulando rapidamente para o momento presente. Ontem fui visitar a 29a Bienal de São Paulo no pavilhão do Ibirapuera. Os curadores tinham anunciado a participação de artistas de vários outros países e que o tema deste ano seria “Arte e Política”. Fui, com minha câmera fotográfica, para ver o que vinha por aí. Fazia muito tempo – uns 10 anos – que eu tinha desistido de ir às bienais. Pela mesmice das obras, pela repetição cansativa, e pela ausência de obras representativas das belas artes, nacionais e internacionais. A bienal se transformou em mais um apêndice do sistema monopolista das artes atuais, onde predomina quase absoluta a chamada arte conceitual.

Foi o que vi por lá ontem. Instalações que repetem padrões que vêm desde as primeiras instalações de cem anos atrás, ou seja, já não há mais novidades, apenas “releituras” nauseantes (arte contemporânea?); vídeos extremamente chatos (imagine colocar uma câmera num ponto estratégico da avenida Paulista e deixá-la lá por horas filmando o trânsito chato de São Paulo – e isso é apresentado como arte!); fotografias, fotografias espalhadas por todos os vãos do prédio, confundindo o público, que pode se perguntar: isto é uma Bienal de fotografia? E eu acrescento: será que já não se sente uma espécie de saudade da pintura figurativa e por isso a chamada arte contemporânea está repleta de fotografias? (fotografias figurativas, diga-se de passagem!)

Mas não é só e apenas isso. Falta o elemento principal presente no sistema de arte hoje, que inclui a Bienal de São Paulo: há o ESPETÁCULO! Sim, senhores, numa sociedade pós-moderna como a nossa que espetaculariza tudo, nada mais coerente do que a espetacularização atingir as artes visuais.

"Liberte os urubu!" - a "arte" de Rafael Pixobom
É aqui que chegamos para tentar explicar o que aconteceu com os três fatos acima citados. Gil Vicente somente conseguiu expor seus agora famosos desenhos não porque eles tivessem qualidade técnica (que os têm – mas isso não é mais importante para a curadoria de arte atual), mas exatamente porque eles iriam “causar” polêmica, quando propõem a morte do papa, do Lula e do Ahmadinejad. O argentino, que não se sabe se sabe desenhar ou pintar, expertamente copiou e colou fotos de Serra e Dilma da internet, ampliou-as para os quatro metros de altura e aí está: conseguiu se sobressair, pois o TRE e os curadores disseram um NÃO, não às fotografias, mas à tentativa dele de apoiar Dilma. E o terceiro acontecimento, o do garoto com o spray na mão atacando a obra de Nuno Ramos, nada mais é do que uma reação de violência natural à violência da instalação que apresenta peças enormemente marrons, escuras e feias, em cujo topo das quais ele resolveu colocar três pobres urubus vivos. Por que? Será que não seria melhor, já que quer falar da violência na cidade, pintar um quadro que também contivesse três urubus pintados?

Para concluir, digo que realmente Afonso Romano de Sant’Anna, poeta e crítico de arte, tem razão: a instituição Bienal já era! Ela está dando seus últimos suspiros na Bienal de Berlim (que visitei em julho deste ano, completamente sem público, porque os alemães estavam mesmo é formando fila para ver obras de qualidade nos museus), e resiste ainda na Bienal de Veneza. Aqui em São Paulo, já deu sinais de exaustão, de morte ainda não anunciada, porque os técnicos que administram a Fundação Bienal querem de fato tornar a instituição uma grande fonte de renda! Fonte de inspiração, de beleza, de reflexão, de contemplação, de enlevamento da alma humana, sentimentos produzidos pela Arte verdadeira, já não são valores que interessam ao sistema da arte atual. Os valores são outros: os das Bolsas de Valores.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Ferreira Gullar falando de arte

ENTREVISTA COM FERREIRA GULLAR

Ferreira Gullar
Ferreira Gullar, um dos mais importantes críticos de arte da atualidade, além de poeta, concedeu esta entrevista abaixo em 2007 ao Jornal de Brasília, que transcrevo, pela sua atualidade e importantes observações sobre o mundo das artes plásticas hoje. Uma pena que, à medida em que envelhece, este poeta vai ficando cada vez mais retrógrado em sua visão de mundo...

É importante lembrar que Ferreira Gullar e Hélio Oiticica, artista plástico brasileiro, participaram juntos da criação do Neoconcretismo, no final dos anos 50. Em 1959, Gullar escreveu o Manifesto Neoconcreto, que influenciou decisivamente o desenvolvimento da obra de Oiticica. Em seguida, Gullar formulou sua Teoria do Não-objeto, a partir da observação do processo criativo de Lygia Clark. Depois, ele fez autocrítica dessas posições anteriores.

Jornal de Brasília - No que consiste e o que induziu a esta situação de mistificação no território das artes?

Ferreira Gullar - A questão é que as tendências mais radicais da arte contemporânea levaram a uma destruição das linguagens artísticas. Por falta de coragem, não se faz a crítica deste processo, no momento em que as propostas radicais da vanguarda chegaram a um ponto de exaustão, chegaram a um ponto onde não tem mais nada a ver com a arte.

J.B. - Como isto se torna possível?

Gullar - Por um lado existe uma crítica omissa, conivente e conveniente, por outro lado existem instituições que, de alguma maneira, dependem desta situação para sobreviver. Você tem o exemplo de uma exposição de renome internacional como a Bienal de Kassel, que teve como curador um sujeito que declarou que não sabia mais o que era a arte. Ele selecionou os nomes dos artistas. Claro que não é possível definir cientificamente o que é arte. Mas se uma pessoa não sabe o que é arte não tem condições de organizar uma Bienal.
J.B. - Qual o alcance da crítica que dirige a Marcel Duchamp? Até que ponto nega Duchamp? Ele não ampliou o repertório, os materiais e os limites da arte?

Gullar - É preciso colocar as coisas em seu devido lugar. Eu não nego a importância de Marcel Duchamp. Mas ele é apenas um dos que ampliaram o campo da arte para as novas formas como objeto. O caminho de ruptura com as formas tradicionais já havia sido aberto pelos dadaístas. E o próprio caminho que Duchamp
segue é uma conseqüência de papier collé cubista. A utilização da estopa, areia e prego nos quadros cubistas já prenuncia o abandono da tela e a incorporação do objeto como matéria da arte. Duchamp não nasceu do nada. A diferença está entre o que Duchamp fez no tempo dele e no que se quer fazer hoje.

J.B. - Em que sentido?

Urinol, de Duchamp
Gullar -  Quando Duchamp enviou um urinol a um salão estava realizando um gesto de alto inconformismo e denunciando uma série de imposições que envolviam a arte naquele momento. O urinol não é obra de arte. Quando ele fez isto o seu gesto era rebeldia, mas hoje seria puro conformismo. As instituições já assimilaram este gesto. Esta atitude de denúncia e de arte sem linguagem já se exauriu. Em Duchamp esta atitude era significativa de uma postura ética. Mas por outro lado contribui para a destruição da obra de arte. Duchamp sacrificou a sua obra em razão desta atitude ética. A obra de Duchamp é datada.

J.B. - Em entrevista, você afirmou que Lygia Clark e Hélio Oiticica eram excessivamente cerebrais. Mas a busca dos dois não era precisamente do sensorial?

Gullar -  O Hélio era um cara de um indiscutível talento e que levou ao ponto extremo as experiências do neo-concretismo do qual eu era o teórico. E digo mesmo que houve uma influência recíproca dos artistas plásticos sobre a minha poesia e da minha poesia sobre os artistas plásticos. O meu Poema Enterrado influenciou os trabalhos de Hélio. Então eu não estou falando de fora. Nós pegamos a linguagem concreta e altamente intelectualizada e colocamos uma nova substância nela. A Lygia tem uma trajetória de uma enorme coerência, desde o momento em que os quadros delas incorporaram a moldura como espaço de expressão até a série Bichos, inovadora e verdadeira.
Mas, ao invés de aprofundar o desenvolvimento desta linguagem, ela resolveu seguir adiante, destruindo a própria linguagem. Quando coloca sacos de papel na parede ou fios de nylon na boca, reduz a experiência estética a algo meramente sensorial. Acaba com a dimensão reflexiva e espiritual da obra de arte. E consequentemente o homem se torna um bicho.
E agora respondo a sua pergunta: o excesso de intelectualismo levou ao puro sensorial.

J.B. - Mas você faria esta mesma avaliação do trabalho de Hélio Oiticica?

Gullar - O último trabalho que vi do Hélio era uma instalação no Hotel Meridien. Era um espaço com água e pedrinhas. Você tinha de retirar o sapato para sentir a água e as pedra. Olha só aonde leva este cerebralismo: a idéia de recriar a natureza dentro de um hotel. Francamente, se é para sentir a natureza acho melhor ir para Mauá.
E, ao invés de colocar as implicações deste tipo de atitude, a crítica fica louvando. Quem criticar isto é careta ou reacionário. Outro dia eu tive uma discussão com uma amiga minha e ela citou Andy Warhol que dizia que uma atitude podia ser uma obra de arte. Mas quem é Andy Warhol? É o papa? É deus? Ele era um artista interessante que se rendeu ao comercialismo. Como teórico para mim era um babaca.

J.B. - Não haveria, por exemplo, sintonia entre os parangolés de Hélio Oiticica e os mantos de Arthur Bispo do Rosário?

Obra de Bispo do Rosário
Gullar -  Não tem nada a ver. Os parangolés surgiram a partir do momento em que Hélio Oiticica passou a freqüentar a escola de samba da Mangueira. É algo muito pobre se você comparar com a roupa de uma porta-bandeira, colorida, barroca, popular. É uma arte que remonta ao século 17. Aí o Hélio botava a roupa em um passista e pedia para o cara rodar e falava que isto ele estabelecia uma relação da forma com o espaço e a luz. É pura teoria. Qualquer objeto rodando mantém uma relação com o espaço e a luz.

J.B. - Mas a incorporação que o Bispo faz dos objetos não evoca a procedimentos da arte moderna?

Gullar -  O Bispo é exatamente o contrário da arte moderna. Em seu delírio, ele quer salvar os objetos do mundo. Ele começou a desfiar o próprio uniforme de interno para bordar um manto sagrado. A sua busca é busca do sagrado. Não tem nada a ver com a sofisticação vazia da arte moderna. Só um louco se entrega totalmente a esta missão de salvar os objetos do mundo. É uma loucura que imprime esta força interior aos objetos do Bispo.
A arte moderna é de decadência, de cerebralismo, de sofisticação exaurida. O que a arte precisa é de paixão e não de cerebralismo. No contexto pretensioso desta arte moderna todos se acham gênios.
O Leonardo da Vinci, quando pediram a ele uma escultura, realizou um estudo reunindo todos os escultores que admirava no passado. Hoje o sujeito enrola três tijolos com arame, manda para a Bienal e diz que é arte. Na Bienal de Veneza, eles aceitaram um açougueiro que tinha cortado uns pedaços de tubarão. Agora não é mais necessário aprendizagem artística. Nas bienais nós temos açougueiros, marceneiros, eletricistas, cineastas. Li que Almodóvar expôs na Bienal de Veneza. Eu queria perguntar a ele se para ser cineasta não é preciso aprender a linguagem do cinema.

J.B. - E, agora, que perspectivas vê para a arte diante do mundo?

Gullar -  Acho que o que a arte tem de fazer é parar de falar sobre ela mesma e começar a falar do mundo. Nós temos 40 mil anos de arte falando do mundo e dos problemas do  homem no mundo. A arte deve voltar a falar da vida.

Arte pré-histórica

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

A gente não quer só comida

Nestes dias finais de campanha eleitoral, em que a realidade da eleição da primeira presidenta do Brasil – Dilma Roussef – se torna a cada dia mais presente, a gente aproveita este momento para lançar algumas sementes que podem tornar nosso futuro mais colorido. A gente quer falar aos candidatos progressistas.

Pintura de Hans Holbein (1497-1543)
A gente? A gente é artista, a gente é essa gente que faz arte, que é também agente de transformação: trans-Forma-Ação. A gente pega o mundo, a gente age: a gente pinta, a gente canta, a gente dança, a gente ensaia, a gente treina, a gente declama, a gente escreve, porque “a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e Arte”*!

A gente está espalhado pelo Brasil a fora, Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão; Pernambuco, Goiás, Rio, Bahia. A gente mora nos confins do Tocantins, habita as beiras dos pantanais. A gente se espalha pelos pampas, pelas praias, entre as serras, até dentro do mato. A gente é moreno, a gente é misturado, a gente borda e pinta. A gente é torrado de sol, banhado de mar, ou pálido de garoa. A gente habita morros e condomínios, a gente se mistura nas areias cariocas ou nas paulistas avenidas. A gente é nordestino, sulista, nortista, a gente é brasileiro. A gente é artista. A gente faz cultura. A gente quer falar!

- A gente quer o direito de pintar, de desenhar, de esculpir e DE EXPOR em TODAS as galerias e museus do Brasil, com todas as nossas cores, nossos quadros, nossas tintas, nossos estilos!

- A gente quer exposições de arte em TODO o Brasil, festivais, concursos, competições de arte. A gente quer mais museus, a gente quer mais galerias, mais pinacotecas. A gente quer democratizar o direito de fruição das artes para TODOS. A gente não quer continuar sendo expurgado do mercado pelo mercado. A gente quer que o Estado brasileiro incentive TODAS as formas de manifestação artística, todas as estéticas. A gente grita: “fora o pensamento único onde predomina o conceitual e a abstração. Arte é mais!”

- A gente quer financiamento do Estado para que surjam mais ateliês de arte, mais galerias, mais espaços artísticos, mais exposições.

- A gente quer democratizar as mostras de arte vindas do exterior para todos os Estados brasileiros, para que todo o Brasil possa ver as grandes obras dos grandes mestres de fora.

- A gente tem música na alma, a gente quer compor, a gente quer tocar, a gente quer cantar toda a música possível para TODA a multidão de brasileiros, se tivermos milhares de espaços pelo Brasil a fora. A gente quer cantar em grupo, em banda, ou sozinho.

- A gente quer trocar, a gente quer mostrar, a gente quer intercambiar nossas diferentes formas e expressões artísticas, em múltiplos encontros, seminários, conferências, congressos, convescotes, autos, seja o que for que junte gente. E junte a gente.

- A gente quer meios de reprodução para a arte que permita a todos o acesso à arte. A gente quer que todos os brasileiros tenham direito ao direito fundamental de todos de ter acesso a toda forma de arte, de poder se enriquecer espiritualmente com a arte.

- A gente quer suplantar a forma de cultura de massa, imposta pela tv, que homogenisa tudo. A homogeneidade é um crime contra a diversidade cultural da humanidade e do povo brasileiro. A gente não é só um, a gente é multidão, a gente é arco-íris.

- A gente não quer só ouvir no rádio música estrangeira, a gente quer usar todos os espaços para todos os artistas brasileiros, de norte a sul, sem predominâncias regionais. A gente é gente em todo o Brasil.

- A gente quer banda larga para todos, para todos os artistas populares, para todos os pontos de cultura, para todas as tribos cidadãs.

- A gente quer mais aulas de História da Arte, a gente quer mais aula de Arte, a gente quer mais arte nas escolas públicas e privadas. A gente quer escolas de qualidade, a gente quer professores bem pagos, bem formados, empenhados.

- A gente quer mais bibliotecas, amplo acesso aos livros, livros a preços populares, livrarias populares para todo lado, feiras de livro, concursos literários, incentivo à prosa, incentivo à poesia.

- A gente quer teatros, salas de encenação, incentivo aos existentes e à criação de novos grupos de teatro, com formação de atores e diretores. A gente quer balé, a gente quer dançar, a gente quer sambar, a gente quer rir. A gente, que é palhaço, a gente quer circo, a gente quer praça, a gente quer trapézio, a gente quer lona, a gente quer público, e gente pra rir ainda mais.

- A gente quer fazer e ler poesia, quer mostrar nossos versos, nossas rimas, nossos livros. A gente quer publicar nossos livros de prosa e poesia.

- A gente quer fotografar, filmar, fazer roteiro, a gente quer fazer cinema. A gente quer mais espaço para o cinema brasileiro, um cinema criativo, não simples imitação de padrões impostos. A gente quer que funcione o sistema de distribuição dos nossos filmes.

- A gente quer preservar nossa memória cultural: nosso folclore, nossas festas, nossos reizados, nossos blocos, nosso samba, nosso bumba-boi, nossas violas, nossas rezas, nossos cantos, nossas danças, nossos cordéis, nossos terreiros, nossas toadas, nossas emboladas, nossos sanfoneiros, nossos repentes, nossos raps, nossos artesãos, nossos bonecos, nossas caretas, nossas máscaras, nossos carnavais, nossas feijoadas, nossa cachaça, nossos trajes, nossas bombachas, nossas galinhadas, nossos forrós, nossos são joãos, nossos jogos de futebol, nossas gravuras, nossa pinturas, nossas folias, nossas alegorias, nossas alegrias!

Para fazer um país rico, próspero, há que se voltar com todos os olhos para a vida cultural brasileira e permitir a este povo criativo que surja com suas cores, com seu canto, com sua raça, com sua graça. Pois o ser humano sempre quererá ser maior do que é, sempre se voltará contra as próprias limitações, sempre terá o anseio de tudo querer e tudo poder.

Avançamos muito, enquanto Brasil no governo do presidente Lula, mas podemos ir ainda mais longe. Podemos suplantar todas as incertezas quanto ao dia de amanhã que rondou sempre a gente brasileira, criando um novo país em que todo o povo também tenha tempo, disposição e desejo de se por em contato mais íntimo com a Arte, em todas as suas formas de manifestação.

Pois o ser humano “sempre necessitará da arte para se familiarizar com a sua própria vida e com aquela parte do real que a sua imaginação lhe diz ainda não ter sido devassada.” (Ernst Fischer)

A gente quer a vida como a vida quer*!

* trechos da música Comida, composição de Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Sérgio Brito.