"O abandonado", Odd Nerdrum |
Odd Nerdrum é um pintor figurativo contemporâneo, que nasceu em Helsingborg, na Suécia, em 8 de abril de 1944. Ele mora há muitos anos na Noruega. Já bastante conhecido na Europa e Estados Unidos, Nerdrum guarda em sua pintura, ao longo de sua carreira, uma evidente influência de dois grandes mestres, Caravaggio e Rembrandt.
Odd Nerdrum |
Sua pintura mantém-se fiel ao estilo clássico, mas é absurdamente atual no sentido de provocar espanto e inquietação. Seus temas em geral são alegóricos, com uma forte influência da mitologia e da cultura dos países gelados do norte europeu. São mundos de sonhos, ou de pesadelos, os que ele pinta sobre o fio tênue entre a realidade e a imaginação. Algumas pinturas revelariam um futuro apocalíptico, em outras um retorno ao passado dos grandes mestres. Odd Nerdrum pinta pessoas atuais vestidas com roupas daquelas épocas.
Ele não gosta de ser chamado de artista e diz que a arte atual - conceitual ou abstrata - não lhe diz respeito e que é uma arte reacionária. Outsider completo, vive recluso em uma pequena cidade gelada da Noruega, onde recebe alunos de vários cantos do mundo que passam uma temporada estudando com ele.
Em sua fase de formação, chegou a estudar com Joseph Beuys, um artista alemão totalmente conceitual, mas que teria lhe acrescentado muito pouco. Em uma entrevista a um site espanhol (www.descubrirelarte.es), Nerdrum conta:
"O assassinato de Baader", Odd Nerdrum, 1977 |
- O senhor Beuys e eu nos dávamos muito bem a nível pessoal, mas divergíamos em relação a aspectos concernentes à arte. Por exemplo, em uma ocasião ele me disse “esta mesa em que estamos sentados é só um amontoado de moléculas e nada mais, por isso seria impossível pintá-la”. Lhe respondi: “Se tu estivesses no meio de uma tempestade de neve a ponto de morrer de frio e descobrísses uma cabana cujas janelas estavam iluminadas de luz e sabendo que era tua salvação, pensarias que esta cabana é um monte de moléculas? Para mim é uma cabana!”
Na mesma entrevista, Odd Nerdrum faz uma distinção entre os termos “pintura figurativa” e “pintura clássica figurativa”. É importante esta distinção, diz ele, “porque praticamente todos os pintores são figurativos, inclusive Miró” (pintor abstrato espanhol). A pintura de Nerdrum é “difícil de realizar, porque é necessário ter uma grande quantidade de conhecimento técnico. Com 18 anos conheci o trabalho de Rembrandt pela primeira vez e compreendi em seguida que o caminho seria longo, que eu fracassaria muitas vezes antes de chegar a pintar uma tela com maestria aquilo que quisesse fazer”.
E continua contando ao entrevistador:
- “No princípio da minha carreira me interessei muito por Caravaggio, um pintor que naquela época não era muito conhecido. Foi só depois de 1968 que suas obras passaram a ter um preço muito alto e sua fama a se espalhar pelo mundo. Me acusaram, então, de ser seguidor de Caravaggio… Em seguida, comecei a estudar as esculturas gregas, egípcias e, obviamente, cheguei a Rembrandt. É curioso, porque os críticos de arte diziam que eu estava começando a ficar mais original, quando era exatamente o contrário, eu nunca havia sido original e não estava abandonando essas influências. Na minha opinião a única coisa “pessoal” de verdade é a atração que um mestre exerce sobre nós, pois nem Rodin e nem El Greco foram particularmente “originais”, mas a paixão de suas vidas se manifestou na argila ou na pintura…”
Autorretrato, Odd Nerdrum |
Odd Nerdrum costuma ser chamado um “pintor kitsch”, uma palavra de origem alemã cujo significado é meio complicado de explicar, mas a grosso modo seria uma certa relação entre a cultura erudita e a popular expressada através de figuras do imaginário popular entranhadas nas belas artes, no caso da pintura. O pintor norueguês diz que “se tivesse nascido há 300 anos, adoraria ter sido um pintor de retratos. Mas um pintor kitsch é alguém que reinterpreta sua relação com a arte e com a sociedade e que sente uma grande compaixão pela humanidade: suas obras tomam um certo distanciamento irônico para mostrar às pessoas os duplos significados e as distintas leituras. Os antecedentes seriam todos os artistas que buscaram seu próprio modo de expressão de forma independente das modas ou correntes estéticas, como Goya, Rembrandt, Caravaggio, Munch… Ou o grande Velázquez que se tivesse vivido no começo do século XX lhe teriam chamado de “pintor kitsch”...
Sobre seu processo de trabalho e quanto tempo dedica a uma pintura, Odd Nerdrum disse:
"O tempo pode variar de alguns meses até 10 anos ou mais. O pintor nunca acaba de todo um quadro; só as máquinas terminam as coisas. Meu processo de trabalho? Gosto da vida, gosto de trabalhar e também de dormir. Explicar meu processo de trabalho é como falar sobre a circulação do meu sangue. O que posso dizer é que cada vez utilizo mais os dedos para pintar, assim como lixas, trapos e também o pincel. Os três eixos de meu trabalho são grandes composições narrativas, o vazio (o ser humano sem contato com o planeta Terra) e quadros idílicos, com figuras em paisagens de uma harmonia arcádica. Me sinto bem com cada tema desses. Posso dizer que minhas ideias não pertencem aos mitos, mas surgem de leituras filosóficas que faço".
Desenho de Odd Nerdrum |
Odd Nerdrum tem sido procurado por artistas de todos os lugares do mundo, e influencia muitos deles de forma evidente, de artistas mexicanos, norte-americanos, europeus de vários países, russos, asiáticos. Neste ano de 2016, o brasileiro Bruno Passos passou uma temporada no ateliê de Nerdrum na Noruega, no começo do ano, tomando umas lições de pintura e, segundo ele, discutindo política e filosofia, temas que “não saiam da pauta”: “a pintura praticamente só entrava se estivesse linkada com um destes temas. Interessante notar como arte é consequência, não causa…” (Leia o relato de Bruno aqui)
Na entrevista ao site espanhol, Nerdrum disse sobre seu interesse em ensinar diretamente a artistas mais jovens: “Simplesmente aconteceu. Estamos vivendo um tempo difícil para a pintura clássica e figurativa, por isso é importante criarmos um lugar nosso, nos ajudarmos mutuamente”.
Muitos dos temas dos quadros de Odd Nerdrum estão baseados na cultura nórdica e refletem o desenvolvimento das sociedades escandinavas. Representa estados psíquicos, usando a si mesmo muitas vezes como modelo para pinturas que nos passam uma certa angústia. O tema da morte, por exemplo, é um dos presentes na pintura do artista norueguês. “A angústia é o meu patrão”, tem dito em suas raras declarações à mídia.
O trabalho de Odd Nerdrum pode ser visto em vários museus do mundo, como o Metropolitan de New York, o San Diego, o de Arte Walker, o de Arte de Milwaukee (todos nos EUA), assim como o Museu de Gotenbourg, Suécia, e na Galeria Nacional de Oslo, na Noruega.
Odd Nerdrum também é profundo conhecedor de História da Arte e Filosofia. E um crítico de seu tempo também, como pode se ler em seu artigo Overcoming the Germanification of Europe.
Algumas de suas pinturas, de vários períodos, abaixo.
Para saber mais sobre Odd Nerdrum, em seu site (clique aqui)
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