segunda-feira, 25 de julho de 2011

Salve o artista, salve o escritor!


Retrato de Baudelaire, por Gustave Courbet, 1848-1849, óleo sobre tela, 54x65cm

Hoje, 25 de julho – quase não se sabe – é o Dia do Escritor. O dia daquele e daquela que tem o poder de agarrar o poder de uma palavra solta juntando-a a outras, dando-lhe uma trama, uma tecelagem, um tecido-sentido, um algo que faz com que o ser humano converse com a alma de outro ser humano…

Como um artista, o escritor escolhe letras, palavras, frases. Escreve prosa, poesia, teatro, compõe. Conversa através da mágica criada pelas folhas do livro – ou pelo toque das mãos na tablet fria. E tudo se passa ali entre o olho e o texto, criando um canal que penetra olho a dentro, alma a dentro, mudando o homem, mudando a vida.

Há algo na magia de ser escritor e artista que transcende a persona. O “eu” que tem um nome se transforma muitas vezes num nome que mexe e remexe profundamente na simbologia individual de cada um: Dostoievski, Dostoievski, Dostoievski… Esse nome faz parte de mim, tem histórias comigo, me traz lembranças, pensamentos, sentimentos, tristezas boas.

Fernando Pessoa, Carlos Drummond, Vinicius de Moraes, Walt Whithman, Balzac, Victor Hugo, Hemingway, Charles Dickens, Graciliano Ramos, Jorge Amado, Affonso Romano, Clarice Lispector, Edgar A. Poe, E.T.A. Hoffmann, Kafka, João Cabral de Melo Neto, Baudelaire, Balzac, Stendhal, Gustave Flaubert…

E Guimarães Rosa, Guimarães Rosa, Guimarães Rosa…

São mais do que pessoas, são minha própria alma em formação.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Lucien Freud morreu, viva Lucien Freud!


O pintor realista Lucien Freud
Morreu na noite do dia 20 para 21 de julho (anteontem), o pintor realista naturalizado inglês, Lucien Freud, uma grande figura da arte contemporânea. Após uma breve enfermidade, morreu aos 88 anos de idade.

Lucian Michael Freud nasceu em 8 de dezembro de 1922 na cidade de Berlim, na Alemanha. Filho de pais judeus,  Ernst Ludwig Freud, arquiteto, e de Lucie Brasch, ele era neto do psicanalista Sigmund Freud. Lucien emigrou com sua família para a Grã-Bretanha, após a subida dos nazistas ao poder. Logo após a II Guerra ele começou a ser conhecido como pintor, graças aos retratos de personalidades da época.

Os temas de suas pinturas são geralmente a vida de pessoas comuns, que levam uma vida comum: seus amigos, famílias, amores, crianças, nus, mulheres gordas, rostos marcados. Ele passava a impressão de não dar nenhuma concessão à estética contemporânea, pintando essas cenas comuns da vida de pessoas comuns, muitas das quais seus amigos íntimos. Fez muito retratos, entre os quais o da rainha Elizabeth da Inglaterra, mas do seu jeito, com sua visão pessoal.

Certa vez, Lucien Freud disse ao crítico de arte Robert Hughes: “Eu jamais poderia colocar numa pintura nada do que não esteja ali, à minha frente. Isso seria uma mentira deslavada, um golpe baixo.” Isso explica sua escolha pela pintura figurativa, realista.

Ele morreu em sua casa em Londres, onde vivia de maneira simples: uma casa com jardim situada no bairro de Notting Hill onde ele tinha instalado também seu atelier.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Candido Portinari no MAM de São Paulo


O Museu de Arte Moderna de São Paulo, localizado no Parque do Ibirapuera, traz para o público uma exposição do pintor brasileiro Candido Portinari. São cerca de 90 obras, que retratam diversos períodos da carreira do artista, desde 1920 até 1945. Entre as obras mais conhecidas (“Retrato de Maria” (1932), “Domingo no morro” (1935), “Sapateiro de Brodowski”(1941) e ”Criança morta” (1944), podem ser vistos outros trabalhos menos conhecidos, como o retrato “Meu primeiro trabalho”, de 1920.


Portinari
Candido Portinari nasceu em 1903, numa fazenda de café aonde seus pais – camponeses italianos imigrantes – trabalhavam, na cidade de Brodósqui, interior de São Paulo. Desde muito cedo, seu talento para o desenho sobressaiu e, incentivado por sua família, com apenas quinze anos de idade foi para o Rio de Janeiro estudar artes plásticas. Inicialmente foi aluno de desenho no Liceu de Artes e Ofícios, até conseguir uma vaga na Escola Nacional de Belas Artes, onde estudou dentro dos cânones acadêmicos da pintura.

Em1928, com a tela “Retrato do poeta Olegário Mariano” (que pode ser vista no MAM), ganhou como prêmio uma bolsa para estudar na Europa. Visitou a Inglaterra, a Itália e a Espanha até ir para Paris, onde permaneceu até 1931, quando retornou ao Brasil. Nessa viagem fez duas descobertas fundamentais – como aponta a curadora da exposição Annateresa Fabris, em seu livro “Portinari, pintor social”: ele descobriu os pintores renascentistas italianos e os pintores da Escola de Paris, “sobretudo Matisse, Modigliani, Picasso”.

Nesse período na Europa, Portinari observou muito o andamento das artes plásticas, as novas correntes estéticas que se formavam por lá. Era o começo do fim de sua influência pelas regras acadêmicas da Escola Nacional de Belas Artes do Rio.

O mestiço, de Portinari
Foi lá, distante de sua terra natal, que Portinari descobriu a riqueza plástica do Brasil e dos brasileiros. Numa de suas cartas, escreveu:

“Apesar de eu ter sangue de gente de Florença (…) eu me sinto um caipira. Daqui fiquei vendo melhor a minha terra – fiquei vendo Brodósqui como ela é. Aqui não tenho vontade de fazer nada. (…) A paisagem onde a gente brincou a primeira vez e a gente com quem a gente conversou a primeira vez, não sai mais da gente, e eu quando voltar vou ver se consigo fazer a minha terra.”

Quando Portinari voltou ao Brasil em 1931, encontrou um ambiente muito novo. A Semana de Arte Moderna de 1922 já rendia seus frutos pelo país a fora e o espírito modernista tomava todas as mentes. Intelectuais e artistas estavam imbuídos desse novo modo de pensar o País, e logo veem em Portinari o representante plástico do Modernismo. Um de seus mais entusiasmados defensores era o escritor paulista Mário de Andrade.
Em 1934, Portinari faz sua primeira exposição individual em São Paulo, recebendo elogios de Mário e de Oswald de Andrade. Oswald chegou a dizer que Portinari era “o grande revolucionário da pintura brasileira”:

(…) o Brasil tem em Candido Portinari o seu grande pintor. Mais do que escola, que faça exemplo. Pintor iniciado na criação plástica e na honestidade do ofício, homem do seu tempo banhado nas correntes ideológicas em furacão. Não admitindo a arte neutra, construindo na tela as primeiras figuras do futuro titânico – os sofredores e os explorados do capital”, disse Oswald de Andrade.

Feita a escolha estética, Portinari fez a escolha social, optando por pintar o povo e o trabalhador brasileiro. Nesta exposição atual do MAM, podemos ver diversos desenhos a grafite ou a carvão, esboços para grandes paineis, onde ele representou os trabalhadores do Brasil, que eram o motor da recente industrialização que seguia de vento em popa. Pintou murais com temas como Café, Cacau, Fumo, Carnaúba, Descoberta do Ouro, Borracha, Carvão.
Mas também pintou os retirantes nordestinos em seu mundo árido, sofrido, onde a morte ronda todos os seres vivos: homens, animais e plantas. Olhando para um de seus quadros com esse tema, fazemos imediatamente a ligação com grandes textos de grandes escritores brasileiros, como “Os Sertões” de Euclides da Cunha e “Vidas Secas” de Graciliano Ramos.

Cambalhota, Portinari
Nesta exposição, minha observação pessoal é de que o modernismo de Portinari vem não só da temática por ele utilizada, em consonância com um Brasil que crescia, mas também pela estilização de suas personagens. As figuras são – de modo geral – deformadas, seja no traço, seja nas cores, seja no movimento do pincel. Algo entre a Guernica de Picasso e as litogravuras de Kathe Kollwitz podem ser observadas numa tela como “Criança morta”, de 1944. Em muitas de suas pinturas podemos observar uma forma de expressar seus sentimentos de artista que lembra muito, na minha opinião, os expressionistas alemães. “Os Retirantes”, “O enterro na rede” e até mesmo uma paisagem, como “Paisagem de Petrópolis”, são exemplos, para mim, expressionistas.

Os diversos estudos presentes nessa exposição, para diversos murais pintados por ele, lembra bastante também a estética do Realismo Social praticado no México, nos EUA e na União Soviética, quase simultaneamente (vale lembrar que os norte-americanos somente passaram a praticar o Expressionismo Abstrato somente após 1945 e o advento da Guerra Fria, quando o Realismo Social passou a ser encarado como arte “comunista”. Mas mesmo assim, pintores realistas sobreviveram e pintam até hoje). Os trabalhadores dos pintores desse período, inclusive os de Portinari, possuem grandeza, gigantismo, fortaleza. Suas mãos e pés, sua musculatura agigantada são como formas de mostrar a força do mundo novo que pessoas simples, simples trabalhadores, podem construir.

Não foi a toa, que Portinari, em 1945, se filia ao Partido Comunista do Brasil. Participando de uma exposição de artes para arrecadação de fundos para o partido, lança-se candidato a deputado federal por São Paulo. Mas não foi eleito. Em 1947, lança-se candidato novamente, desta vez a senador. Não foi eleito por uma margem muito pequena de votos, e alguns suspeitam de que sua não eleição sofreu fraude. Ainda em 1947, com as ameaças sofridas por seu partido e por ele próprio, por parte do governo de Gaspar Dutra, resolve se exilar no Uruguai. Ele tinha sido chamado a depor na polícia política diversas vezes e foi incluído em um inquérito contra os intelectuais que lecionavam na Escola do Povo, ligada ao partido comunista.

Em 1948, quando voltou ao Brasil, o Partido Comunista estava na ilegalidade e os mandatos dos parlamentares comunistas tinham sido cassados. Com isso, ele se dedicou cada vez mais a pintar, sem nunca ter oficialmente abandonado o PCB. Faz uma exposição retrospectiva no Museu de Arte de São Paulo, o MASP, onde foi consagrado pela crítica e pelo público. “Sua exposição é amplamente visitada pelas camadas mais populares”, diz a curadora Annateresa Fabris.

Imigantes, Portinari
A fama de Portinari ganhou o mundo. Foi convidado a pintar dois paineis gigantes que decoram o prédio das Nações Unidas, em Nova Iorque, cuja inauguração se deu em setembro de 1957. Essas duas telas gigantes estarão também em exposição aqui em São Paulo, na Oca do Ibirapuera, a partir do próximo mês de agosto.

Cândido Portinari morreu em fevereiro de 1962, após realizar mais de cinco mil trabalhos entre desenhos, pinturas, murais, painéis, esboços e até ilustrações. Morreu intoxicado por suas próprias tintas.

Leia mais, neste blog:
- Portinari de todos os tempos
- Um samba para Portinari

EXPOSIÇÃO:
No ateliê de Portinari (1920-1945)
Local: Museu de Arte Moderna de São Paulo – MAM
Endereço: Parque do Ibirapuera – Av. Pedro Álvares Cabral, s/nº – Portão 3, São Paulo
Data: de 15 de julho a 11 de setembro
Horário: de terça a domingo, das 10h às 17h30 (com permanência até as 18h)

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Um samba para Portinari

Duas excelentes notícias para quem faz e para quem ama Arte:

O Museu de Arte Moderna de São Paulo, abre hoje às 20h a exposição "No Ateliê de Portinari", que reúne obras realizadas por ele entre 1920 e 1945, que pretendemos visitar neste final de semana. Aguardem novo post sobre o assunto, dentro de alguns dias.

Além disso, a Mocidade Independente de Padre Miguel, escola de samba do Rio de Janeiro, vai apresentar no carnaval de 2012 seu enredo que vai falar sobre ele que é um dos pintores mais brasileiros: Candido Portinari. O tema do samba-enredo é "Por ti, Portinari, rompendo a tela, a realidade".

Na apresentação do enredo, no final do mês de junho passado, o carnavalesco Alexandre Louzada falou um pouco sobre a história do pintor paulista, nascido em Brodosqui, ressaltando que a Escola de Samba Mocidade Independente de Padre Miguel vai contar a vida de Portinari “pela sua obra". Ele informou que os componentes da Escola representarão todos os personagens que Portinari retratou em suas pinturas, como plantadores de milho, de café, espantalhos, trabalhadores rurais e urbanos, além de outros.
"Nós seremos os seus guerreiros, só que empunharemos a lança de lápis de cor. Vamos nos colocar como personagens vivos de suas obras. A Mocidade é isso, feita de trabalhadores, de pessoas simples", disse Louzada, durante a apresentação do enredo. "Seremos a moldura viva de um quadro e pedir a ele que pinte a estrela de Padre Miguel", afirmou.
A justificativa apresentada pela direção da Mocidade, para a escolha do nome de Portinari diz que “através de suas mais importantes obras, mostraremos a trajetória deste artista que acima de tudo retratou em seus quadros e murais, a história, o povo e a vida dos brasileiros, através dos traços fortes e vigorosos carregados de dramaticidade e expressão.” 

E acrescenta: “Esta homenagem escrita em forma de poema é a maneira mais digna encontrada para festejar este mestre que além de pintar também foi poeta e que entre outras manifestações artísticas soube tão bem ilustrar com seus desenhos os poemas de Carlos Drummond de Andrade, seu grande amigo e parceiro na versão do livro “Dom Quixote de La Mancha”, de Miguel de Cervantes.”

É esta a linda sinopse do enredo da Mocidade Independente de Padre Miguel para o carnaval de 2012:

POR TI, PORTINARI, ROMPENDO A TELA, A REALIDADE

“Num voo mágico, viaja o samba, /
 a conduzir meu povo feliz / 
em seu viajante sonho.
Solto no universo garboso, prosa em verso, / 
na fantasia a se tornar realidade,
leva os tambores da felicidade, / 
para despertar o artista na morada celestial.

Ó mestre, ergueis do sono esse quadro vazio. / 
Sua obra vive no cantar de nossa gente.
Põe nas tuas mãos o teu instrumento, / 
tua tela hoje é o firmamento,
que a arte se deixa tingir o breu da noite, / 
com um colorido de festa, / 
a aquarela do carnaval.

Vai, reinventa mais um lúdico céu. / 
Pinta por nós a nossa estrela,
tu que pintaste tanto a Mocidade, / 
deixa a tua mão deslizar Independente.

Hoje, somos as tintas que envolvem / 
as cerdas do teu pincel, e que,
na mistura das cores, por ti, Portinari, / 
rompem a tela para a realidade
e brilham no samba de Padre Miguel.

Hoje, uma moldura viva e humana / enquadra a tua história na pista,
e teu traço se refaz nos pés, / no passo do sambista,
que vai riscar murais de sonhos / e estampar retratos,
cena dos Brasis que tu desenhastes.

À luz da inspiração, vem fazer reluzir em nossa mente / 
a cândida infância de tua Brodowski querida,
e reflorescer os campos com suor da lida, / 
dos mestiços viris a lavrar a ampla terra.

“Entre o cafezal e o sonho”, / 
vem reunir retalhos e as lembranças coloridas,
como as dos espantalhos a oscilar na brisa, / 
serenos sobre as plantações.
Hoje, é um tempo que não passa. / 
Um turbilhão, um vento que sopra,
que varre e traz recordações, / e que vem devolver a ti a meninice.

Somos nós os teus meninos, / 
sem rosto, anônimos na multidão,
que fazem girar o teu mundo / 
num rodopio frenético,
como se fossem um pião, / 
tal como um caleidoscópio
a transmutar em formas a tua imaginação.

Somos a quimera límpida, / 
que balança livre num céu pontilhado,
às vezes, de pequenas pipas e balões.
Viemos abrir o teu coração / e revelar esse tal sentimento,
que subjugou a estética, / ao adulterar a técnica pela arte livre,
carregada de emoção.

Nessa força da cor que se imprime, / se diluem teus nativos,
descobridores, heróis desbravadores, / fauna e flora a percorrer paredes
como ciclos, desvendando a história, / o caminhar dessa nação.
Nesta hora, trazemos a alegria / pintada em nossas caras.
O suor que transpira / sob as luzes deste palco
é a nossa emoção que transborda, / ainda que exale de nós
a têmpera do mesmo povo sofrido, / do caminhar errante,
em busca da terra prometida, a vitória.

Imagina nós, os retirantes, / embora a esconder a face dura da vida,
como tão pungente retrataste, / dando o tom da cor às palavras
de “Guimarães” e “Graciliano”, / a cor da dor, escassa,
como a secura da terra do cangaço, /
por vez, na força do traço,
a bravura sertaneja.

A nossa odisséia e a nossa missão / 
é cantar-te, nosso estandarte, a glória,
como quem procura buscar nas alturas a prova.

Somos cenas bíblicas, / tal qual as que interpretastes,
nos vemos Santos, / Anjos olhados por Deus, /
 a voar nos céus azulejados.
Viemos aqui à luta, / contra o inimigo invisível, / 
os moinhos de vento
de uma aventura inventada.

À sorte, nos imaginamos fortes, / como o arauto sonhador
a rabiscar no papel uma estrada escrita / num poema de “Drummond”.
Somos “Dom Quixote De La Mancha”, / 
a empunhar a lança feita de lápis de cor.

Enfim, somos todos iguais esta noite, / 
como aqueles tantos que tua mão desenhou.
Somos o samba, o morro, / a favela, a dança, a música,
o contraste social, / trabalhadores do sonho, /
 assim como os da vida real.
Vamos à luta, / temos as caras das tuas caras, / 
o autorretrato da tua alma.
Somos todos em um, / a tua lembrança viva, / 
a eterna Mocidade,
modernista, revolucionária e guerreira / 
que, aqui neste momento,
ergue a ti um monumento, / um imenso mural, / 
pintado com a nossa alegria,
na batalha feliz deste dia, / 
“Guerra e Paz” do carnaval.

domingo, 10 de julho de 2011

O fascinante mundo em preto e branco de Robert Longo

Catedral da Luz, 2008-2009, carvão sobre papel, 304,5x151,8cm
Não, não se trata de mais um fotógrafo que preferiu eliminar as cores das suas fotos e fotografar com as boas e velhas câmeras antigas. Por mais parecidos que seus trabalhos sejam com fotografia, trata-se, na verdade, de um artista que prefere usar o simples carvão para fazer desenhos super complexos.

Robert Longo
Robert Longo nasceu no Brooklin, Nova Iorque, em 1953. Formou-se em Artes Plásticas no Buffalo State College e entre 1973 e 1975 esteve em Florença, Itália, como bolsista da Accademia di Belle Arti. Já participou de muitas exposições, individuais e coletivas, como a Bienal de Veneza de 1997 e 2002. Mas também já expôs seus desenhos em diversas cidades europeias, entre as quais Lisboa, no Museu Berardo. Ele diz que foi muito influenciado por várias mídias, incluindo o cinema e o desenho em quadrinhos.

Mas o que mais chama a atenção em Robert Longo não é nada mais do que seus enormes desenhos feitos simplesmente com carvão. Segundo ele disse a uma repórter do jornal "O Globo", o fascínio pelo carvão aconteceu meio como um acidente comum a quem é artista. Um dia ele queria desenhar e viu que não tinha lápis. Deu de cara com uns pedaços velhos de carvão e resolveu desenhar com eles. Foi aí que viu a potencialidade incrível do carvão para fazer desenhos maravilhosos.

Um fascínio que dá para compreender. Eu mesma, em minha experiência pessoal com os desenhos a carvão, vejo que há possibilidades imensas de desenho, quando conseguimos domar a “fera” que está por trás do carvão. Muita sujeira se faz até conseguir dominar a fluidez e obter toda a luz possível de um pedaço de carvão preto.

Vista da sala de estudo com livros em 1938, 2002,
167,6 x 274,3 cm, carvão sobre papel (escritório de Sigmund Freud)
Robert Longo falou na mesma entrevista que cresceu “num tempo em que as revistas publicavam fotos coloridas de astros de cinema e de presidentes da república, mas usavam o preto e branco para as imagens da guerra do Vietnã, da fome na India”. E ele diz que isso parecia querer dizer que somente essas duas cores são capazes de mostrar a verdade.

Seus desenhos gigantes falam, também, do mundo contemporâneo. Ele desenhou pessoas contorcidas, pessoas solitárias. Também quis dizer algo quando escolheu representar as três grandes religiões monoteístas da humanidade, desenhando seus lugares sagrados: a Basílica do Vaticano, o lugar de peregrinação mulçumana em Meca, na Arábia Saudita e o Muro das Lamentações em Jerusalém. Tudo isso... desenhado com carvão!

Mas a fotografia é uma coisa, o desenho é outra, claro. Longo ressalta que uma fotografia é obtida a partir de uma máquina, mas o desenho sai direto da mão do artista. Isso tudo é muito interessante, especialmente quando vivemos em um período em que Escolas de Arte ensinam (!) que desenhar já não é mais preciso; ou ensinam que desenhar e pintar está fora de moda. Ou que hoje, com a tecnologia e a informática permitindo outros meios, a mão do artista poderia se reduzir, talvez, aos movimentos sobre o mouse...

Como sou daquelas que desenham e pensam que o mundo será sempre desenhado, fico muito feliz quando vejo um artista "clássico" (desenhista e pintor), como esse, fazendo sucesso pelo mundo a fora!

Robert Longo está em cartaz, com uma exposição dos seus carvões, no Kunsthalle Weishaupt na cidade de Ulm, na Alemanha, além de galerias e museus norte-americanos. Alguns de seus desenhos foram publicados na oitava edição da revista “Serrote” do Instituto Moreira Salles, lançada esta semana na Feira Literária de Parati.


Três dos desenhos feitos com carvão por Robert Longo:
Basílica de São Pedro, Vaticano
Peregrinos em Meca, Arábia Saudita
Muro das Lamentações, Jerusalém