Hoje, terceiro dia de Rio de Janeiro, fui até à Gávea, dar uma olhada no Instituto Moreira Salles, onde sempre há exposições. Foi para cá que veio primeiro a exposição de fotografias de Aleksandr Ródtchenko, antes de ir para São Paulo. Mas cheguei lá às 11 horas e ainda estava fechado. Abre às 13h, o que só descobri vindo ao local, após duas horas de ônibus e trânsito. Falha do portal, que não divulga o horário de funcionamento.
Enquanto isso, fui para o Museu do Universo, no Planetário do Rio, aqui também na Gávea. E por isso diria - dentro do velho ditado - de que os deuses escrevem certo por linhas tortas...
Plutão e Perséfone, de Gian Lorenzo Bernini, escultor italiano, 1622 |
Lá no Museu do Universo vi, vendo a história da Astronomia e sua relação com a cultura dos povos, que os antigos - assim como nós - estavam visceralmente ligados às estrelas. E viam imagens nas estrelas!
Os povos de antigamente usavam o céu como pano de fundo de suas vidas, num tempo em que a luz artificial não ofuscava os céus... Nessa época não havia, nem em sonho, a "feia fumaça que sobe apagando as estrelas".
Os antigos projetavam nelas seus mitos, suas crenças, sua história. As estrelas eram pontos luminosos que se ligavam em linhas imaginárias, na imaginação de nossos antepassados. Ou pixels formadores de imagens. Olhavam ali para aquela multidão de estrelas e viam muito naquilo tudo!
Um exemplo dos mais bonitos sobre a rica capacidade humana de criar imagens e, com elas, criar sua cultura, sua riqueza artística, expor sua alma, está na constelação de Virgem. Nela, nossos antepassados viram estampado o drama da deusa Démeter, protetora da fertilidade e da agricultura. Démeter tinha uma filha de nome Perséfone. Ocorre que Plutão foi ferido pela seta de Cupido e por causa disso raptou a filha de Démeter e a levou consigo para o reino dos mortos.
Perséfone, do pintor italiano Dante Gabriel Rossetti, pintada entre 1873-77 |
Desesperada, Démeter procurou a filha pela terra inteira e, não a encontrando, deixou de fazer com que o trigo nascesse. Júpiter, preocupado com isso, enviou o deus Mercúrio para que negociasse com Plutão o resgate de Perséfone. Um acordo foi feito, mas Plutão impõe uma condição que Démeter é forçada a aceitar: durante seis meses do ano Perséfone estaria com a mãe, e os outros seis meses permaneceria com ele, no Hades. Em troca desse acordo, Démeter só permite que a natureza floresça e dê frutos durante o período em que sua filha estiver com ela, período que começa na primavera e termina no final do verão. Nos seis meses em que Perséfone jaz prisioneira de Plutão, a terra não produz nada. É outono e inverno. Então quando as flores começam a brotar e a natureza dá seus frutos, enchendo tudo com mil tons de verde, é a mãe Démeter feliz com o retorno da filha. A terra se torna iluminada pela luz do sol, que cria todas as cores.
E o ser humano, cá embaixo, vendo aquela inundação de luz e cor, pega o seu pincel e sua palheta e joga sobre a tela as cores que vê ali à sua frente. Mas de uma forma que conte uma história, como contavam os antigos olhando para a imensa tela do céu... Afinal de contas, contar histórias tem sido a forma de o homem se juntar aos seus iguais, falar a mesma língua, criar laços, conexões, figurações...
No período do Renascimento italiano, pintores e escultores, como Bernini e Rossetti, interessados nesse mito, retrataram Perséfone, provavelmente intrigados com uma deusa que passava metade do ano habitando o reino de Hades, para onde vão todos os mortos. Com isso, esses artistas resgatavam velhos mitos gregos e romanos para trazer de volta o Homem para o centro do mundo, indo muito além do mito, hegemônico numa época de muito poder da Igreja Católica, do cristianismo. Démeter, Plutão, Júpiter, Perséfone... são a forma humana de inventar uma cosmologia para o mundo, inspirada nas estrelas do céu profundo. A Cosmologia avançou muito, com a ciência, mas ainda hoje é encantador olhar para o céu estrelado e rever nele as figuras que povoam a mente criativa do homem...
No período do Renascimento italiano, pintores e escultores, como Bernini e Rossetti, interessados nesse mito, retrataram Perséfone, provavelmente intrigados com uma deusa que passava metade do ano habitando o reino de Hades, para onde vão todos os mortos. Com isso, esses artistas resgatavam velhos mitos gregos e romanos para trazer de volta o Homem para o centro do mundo, indo muito além do mito, hegemônico numa época de muito poder da Igreja Católica, do cristianismo. Démeter, Plutão, Júpiter, Perséfone... são a forma humana de inventar uma cosmologia para o mundo, inspirada nas estrelas do céu profundo. A Cosmologia avançou muito, com a ciência, mas ainda hoje é encantador olhar para o céu estrelado e rever nele as figuras que povoam a mente criativa do homem...
Mazé: Seu diário de viagem está uma pintura, ainda mais quando você mistura as palavras com o mesmo amor com que mistura as tintas. É de encher os olhos. Nem parece que está chovendo por aí a barbaridade que a gente vê pela tevê.
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