Confesso que ando com muita preguiça de escrever neste começo de ano... Faz parte da minha onda atual, mais parecida à maré mansa, àquelas praias sem onda onde a gente pode nadar e boiar por horas, sem nenhum sobressalto. Não que eu não esteja em atividade; pelo contrário, cada pedaço de tempo do meu dia tenho usado lendo, estudando, pintando, trabalhando... Alterno isso com longas horas de sono e ausência. Movimentos de fluxo... e de refluxo... como o mar.
Mas hoje tive vontade de tecer uns comentários, de trás da minha preguiça. É que me perguntaram se é fácil expor em galerias de arte no Brasil... Tive que responder, à contragosto, porque esse assunto também me dá muita preguiça! (Devo estar parecendo Macunaíma que vivia repetindo: "Ai que preguiça!")
Galerias. Em geral são espaços fechados, não só fechados no sentido arquitetônico do conceito. Há alguns, inclusive, que mais lembram bunkers, aquelas estruturas fortificadas e feitas para serem resistentes às armas de guerra. Conheço duas galerias assim, uma na Vila Madalena, outra na avenida Rebouças. Mas há outras um pouco mais simpáticas, quando se vê da rua. Da rua. Até você entrar e se deparar com um sujeito - ou uma sujeita - que vai lhe medir dos pés à cabeça e te ignorar assim que sua "medição" descobrir que você não tem onde cair morto, quanto mais algum recurso para adquirir alguma das "obras" ali expostas...
Galerias não são para os "fracos". Há exceções, claro. Mas aqui em São Paulo não conheço nenhuma, mesmo que aberta a conhecer, caso exista. O modus operandi da velha elite paulistana, mesmo a mais metida a intelectual, ainda se espalha por vários espaços culturais desta cidade, impondo seus gostos, sua estética, seus padrões, seu mercado de arte... Que não é para muitos, pois é para POUCOS!
Fora do Brasil, a situação é outra, pois onde há valorização da cultura e das artes, há infinidades de espaços onde cabem muitos. Mesmo aqui em nossa latina América: em Buenos Aires as galerias se espalham pela cidade e elas são espaços mais democráticos do que aqui. Ah o Brasil... quando chegará a nossa vez? Sinto dizer que está cada dia mais distante a nossa vez... Ando mal humorada - nestes tempos bizarros - e preguiçosa de escrever.
Dito isto, respondi com uma careta: não, não mesmo! A não ser que você faça parte da "galera": a mesma que se autodenomina "artista" porque recria e regorgita conceitos robotizados aprendidos de professores de artes conceituais nas nossas academias que são os mesmos que mandam nas galerias, nas exposições, nas bienais, incentivando experimentações ad nauseam, dentro dos mesmos velhos paradigmas das experimentações artísticas que já tem uma idade de pelo menos 100 anos, quando o mundo era outro mundo, e os artistas mais sérios, porque sabiam o que faziam quando se rebelavam contra o status quo... Hoje o "chique" é ser do status quo da arte dita "contemporânea", embebida em jogos sujos de poder. De todos os tipos dos podres poderes...
E viva a arte e os artistas contemporâneos, que somos todos nós, incluindo nós os da pintura figurativa e realista. Nós que preferimos - enquanto uivam as matilhas - ir estudando a pintura clássica com seus grandes mestres, para aprender deles - nessa timeline que já possui mais de 500 anos! Nós, os que não se contentam somente com a superfície da expressão individual em detrimento do aperfeiçoamento pessoal. Porque o conhecimento - o aprendizado dos instrumentos do ofício - não é só o manejar dos pinceis e o escolher das cores, mas o mundo que tudo isso nos abre: nos enriquece como seres humanos, além de tudo.
"O ateliê do pintor", Gustave Courbet, 1854-55, Museu D'Orsay, Paris |
Caríssima Mazé,
ResponderExcluirUm comentário para este post e para o anterior.
Diz a lenda, Ludovico Buonarotti, pai de Michelangelo, era um homem rico, burguesão, incapaz de compreender a genialidade de seu filho, e, por isso, batia nele, por não admitir que Michelangelo trabalhasse com as mãos, uma indignidade inadmissível.
Por isso, ele aprendeu a trabalhar sem utilizar as suas mãos.
Algum tempo mais tarde, veio um Príncipe visitar o atelier de Michelangelo e encontrou o Artista olhando fixamente para um bloco de mármore com seis metros de altura. O Príncipe ouvira comentários que Michelangelo vinha todos os dias, nos últimos quatro meses,olhava algum tempo para o mármore, e voltava para a casa. O Príncipe perguntou o óbvio:
- O que você está fazendo?
Michelangelo virou-se, encarou-o, e sussurrou:
- Estou trabalhando.
Três anos depois, saiu daquele bloco de mármore a estátua de David ...
Abraço,
Garoeiro