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sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Arte em construção, o sonho de Tatlin - parte I


Como neste ano de 2017 se comemora uma data muito importante da história mundial, a Revolução Soviética de 1917 na Rússia, iremos dedicar este ano a falar da arte e da cultura russa neste blog. Os assuntos são muito vastos e são riquíssimos em conteúdo! 

De artistas antigos como Andrei Rubliev, o pintor de ícones, à nova safra de jovens artistas estudantes da Academia Ilya Repin de São Petesburgo, passaremos por todos os assuntos possíveis de serem alcançados em meu trabalho de pesquisa para este blog, levando-se em conta que o material de que dispomos aqui no Brasil, e em São Paulo, onde moro, são um pouco escassos. Faremos o possível para apresentar uma boa mostra do que significa para o mundo ocidental a imensa riqueza que a cultura russa trouxe ao mundo, em especial no século XX. 

Iniciaremos com um primeiro artigo sobre o Construtivismo, que acabei de escrever e será publicado na revista Princípios, da Fundação Maurício Grabois. Aqui, o artigo será dividido em duas partes, sendo que a próxima será publicada nesta segunda, dia 30 de janeiro.


"O ciclista", Natalia Goncharova, 1913, pintura cubo-futurista
Arte como construção, o sonho de Tatlin

Entre o final do século XIX e 1932 aconteceu na Rússia o aparecimento de muitas escolas e movimentos artísticos e intelectuais. Pela primeira vez na história, um grupo de jovens artistas viu concretizar sua visão de arte em termos práticos e com a grandiosidade patrocinada pela Revolução de 1917. Vladimir Tatlin, uma das figuras centrais da chamada “vanguarda russa”, inspirou o nascimento de um destes movimentos, o Construtivismo.

A história do povo russo vem de muito longe, quando povos eslavos começaram a se aglomerar em torno de  Kiev, cidade que hoje se situa na Ucrânia. Os Rus de Kiev, como eles se chamavam, passaram a ocupar uma região que, em termos atuais, alcança toda a Bielorrússia, uma grande parte da Ucrânia e o centro e noroeste da Rússia.

Desenho representando o que seria a antiga Kiev
Na passagem para o século XX, ainda era um país muito atrasado. A imensa maioria de sua população vivia nos campos; suas cidades eram aglomerados labirínticos onde viviam os pobres em casas mal iluminadas, com comida escassa. O regime de servidão somente tinha sido abolido em 1861 e o analfabetismo era generalizado. Os romances de Dostoievski fazem um bom retrato do que era a vida nessa Rússia.

Mas antes ainda, em 1682, tomou posse como czar, o homem que tinha mais de dois metros de altura, Pedro, o Grande. “O reinado de Pedro, o Grande, representou a maior transformação da Rússia antes da Revolução de 1917”, diz o professor de história da Universidade de Yale, Paul Bushkovitch em seu livro “História Concisa da Rússia”. Acrescenta: “Ele realizou em 36 anos uma mudança na cultura russa que levou séculos na Europa Ocidental”. E grande parte de seus feitos diz respeito a ter trazido para a Rússia muito da cultura europeia.

Ponte sobre o rio Neva, 1860
Uma de suas reformas foi a construção da cidade de São Petersburgo em 1703, nos pântanos do rio Neva, no golfo da Finlândia. A construção de São Petersburgo “foi planejada, projetada e organizada inteiramente por arquitetos e engenheiros estrangeiros, trazidos da Inglaterra, França, Holanda e Itália”, diz Marshall Berman em “Tudo o que é sólido desmancha no ar”. Pedro construiu São Petersburgo nos moldes das cidades europeias, num padrão de planejamento urbano advindo do Renascimento. O desenho geométrico e retilíneo dava “ao panorama urbano uma aparência de amplitude horizontal infinita”.

Com suas linhas retas em meio à sinuosidade caótica das velhas cabanas da aldeia anterior, São Petersburgo era considerada por muitos autores como “produto do pensamento” Iluminista. Criou-se, e acentuou-se nas décadas seguintes, a polaridade Moscou - São Petersburgo. Petersburgo representando as forças estrangeiras e ocidentais, a modernidade, a civilização, o novo; Moscou, por seu lado, a tradição, o sagrado, a nacionalidade, o antigo. Este dualismo também alcançava as mentes da intelligentzia russa, chegando ao final do século XIX com duas grandes correntes antagônicas: os Ocidentalistas, defensores da modernidade e os Eslavófilos, defensores da tradição e da cultura nativa.

Selo em homenagem a
Dostoiévsky, com uma
reprodução de pintura de
Vasily Perov
A Literatura era o “campo de batalha da ideologia política e cultural”, como aponta Paul Bushkovitch. As revistas literárias de Puchkin e Senkovski guerreavam entre si sobre suas opiniões de autores russos ou estrangeiros como Goethe e George Sand. O crítico literário Vissarion Belinski, que fazia parte do movimento Ocidentalista, “passou a ser visto na Rússia como o arquétipo do crítico ‘engajado’, que julgava as obras de arte segundo critérios amplamente utilitaristas e de acordo com sua relevância para a reforma da sociedade russa”.

Ele se inspirava nas ideias de Hegel, que dizia que “a arte era uma das manifestações da Ideia na história, junto com a filosofia ou o desenvolvimento do Estado”. A arte que não tinha esse fim utilitarista era insignificante e ruim. Ele considerava que a sociedade russa deveria se aproximar do padrão civilizado do Ocidente - idealizado, é claro. Com esse ponto de vista, Belinski - que se alinhava com os socialistas utópicos - rejeitava totalmente a antiga cultura russa e inaugurava também uma forma de pensar a arte que mais tarde foi utilizada pelos Construtivistas.

Mas em 1863, treze estudantes da Academia de Arte abandonaram a instituição. Ivan Kramskoi e seus amigos se opunham às condições da premiação anual da academia e formaram a “Associação Livre dos Artistas”. Eles rejeitavam os modelos acadêmicos, as regras e convenções da técnica ensinada naquela escola, importados em grande parte da Academia Francesa. Para esses jovens rebeldes, a pintura que se ensinava lá nada tinha a ver com a realidade russa, “que mudava tão rápido em torno deles nos anos 1860”, diz Bushkovitch. Eles e outros artistas pensavam que se tinham que se inspirar em algum modelo europeu, era no pintor francês Gustave Courbet ou nos realistas alemães. Nessa década a pintura russa realista retratava a vida em seu próprio país, como o fizeram Ilya Repin, Vladimir Stasov e Isaak Levitan.

Entre aquelas duas grandes correntes de pensamento (Eslavófilos e Ocidentalistas) foram se gestando miríades de movimentos artísticos, que também acompanhavam o desenrolar da luta política e ideológica que levou à Revolução de Outubro de 1917. Do final do século XIX até à primeira década de 1920 os debates em torno desta questão - a assimilação ou não da cultura europeia - eram muito intensos dentro do mundo artístico russo. Mas uma grande parte dos artistas, em contato com as novidades francesas se deixaram influenciar por elas e levaram as novas estéticas artísticas às suas últimas consequências, inspirados pelo espírito revolucionário que incendiava o país e criava esperança no futuro. “Una de las metas esenciales de todos los artistas de principios del siglo fue incorporar lo experimental - tan característico de los ámbitos científicos - al mundo del arte”, explica Lourdes Cirlot em “Las vanguardias artísticas en el siglo XX”.

"O galo e a galinha", pintura em estilo
raionista, de Larionov, 1912
Matisse, Cézanne, Manet, Gauguin e depois Picasso, com seu Cubismo, tiveram grande influência sobre os artistas russos, que também buscaram formação na França. Também mantiveram uma constante interrelação com correntes estéticas diversas, da França e Alemanha. Os franceses já haviam inaugurado a pintura Impressionista, que depois gerou outros movimentos como o Pontilhismo e o Fauvismo. Na Alemanha, o movimento “Die brücke” (A ponte) já dava os primeiros passos do Expressionismo alemão.

Os italianos, em 1909, inauguraram o Futurismo, movimento que foi liderado por Filippo Marinetti, que depois se rendeu ao Fascismo. Do Futurismo italiano e do Cubismo francês, os russos criaram o movimento conhecido como Raionista, no começo do século XX. Em 1914, Kasimir Malevich cria na Rússia o seu Suprematismo, corrente que abria espaços largos para a Abstração, que já havia sido iniciada por Vassili Kandinsky. Outros artistas russos já haviam passado pelo Raionismo, pelo Simbolismo…

"Tribuna de Lenin", projeto de
El Lissitzky, 1920
Veio a Revolução de 1917. Naqueles tempos de radicalismos, para “os artistas, este era o sinal para a exterminação da odiada velha ordem e a introdução de uma nova, baseada na industrialização”, diz Camilla Gray em seu livro “O grande experimento - Arte russa - 1863-1917” (Camilla Gray foi uma bailarina inglesa que visitou a URSS pela primeira vez em 1955 e deixou como legado uma rica pesquisa sobre a vanguarda russa). “A revolução deu um senso de realidade às suas atividades e uma direção, longamente aguardada, às suas energias - uma vez que não havia, em suas mentes, nenhuma dúvida que os impedisse de identificar suas descobertas revolucionárias no campo artístico com essa revolução econômica e política”.  

A Revolução acendeu verdadeiras fogueiras no coração dos artistas. Malevitch, Rodtchenko, Maiakovski e Tatlin, dentre muitos outros, tomaram em suas próprias mãos a reorganização da vida artística russa enquanto anunciavam que estava terminada a fase da “pintura de cavalete” que eles associavam ao sistema burguês: agora eles tinham as ruas para pintar, as praças e pontes, como arena de suas atividades artísticas.

Nos quatro primeiros anos pós-revolucionários conseguiram montar museus e escolas de arte por todo o país, assim como salas de teatro e de concerto. Foram eles que decoraram as ruas para as celebrações de Primeiro de Maio e do aniversário da Revolução. Artistas, atores, escritores, músicos e compositores se empenharam em organizar espetáculos de arte para festejar essas datas. “Trens decorados com temas revolucionários foram enviados para o front levando notícias da Revolução política e artística para todos os cantos do país”, conta Camilla Gray.

Vladimir Tatlin
Em 1919, o Departamento de Belas Artes encomendou a Vladimir Tatlin o “Monumento à III Internacional”. Era um projeto para ser erguido no centro de Moscou.Tatlin trabalhou neste projeto de 1919 a 1920, construindo um modelo em madeira e metal. Esta obra foi exibida no VIII Congresso dos Sovietes em dezembro de 1920. Foi este o primeiro símbolo do movimento Construtivista, que se tornou modelo para as esculturas de Naum Gabo e os móbiles de Alexander Rodtchenko.

Camilla Gray, que teve acesso aos esboços e projetos, assim descreve o “Monumento à III Internacional”, de Tatlin:

O monumento de Tatlin era para ter duas vezes a altura do Empire State Building. Seria executado em ferro e vidro. Uma armação espiral em ferro apoiaria um corpo formado por um cilindro de vidro, um cone de vidro e um cubo de vidro. Esse corpo seria suspenso sobre um eixo assimétrico dinâmico, como uma Torre Eiffel inclinada, que prolongaria, assim, seu ritmo espiral, espaço adentro. Tal ‘movimento’ não iria limitar-se ao desenho estático. O corpo do próprio Monumento mover-se-ia literalmente. O cilindro deveria girar sobre seu eixo uma vez por ano: a esta parte do edifício seriam destinadas atividades tais como: palestras, conferências e reuniões do congresso. O cone deveria completar uma revolução uma vez por mês e abrigar atividades do executivo. No topo, o cubo deveria completar uma volta completa em seu eixo uma vez por dia, e ser um centro de informações. Iria constantemente transmitir boletins, proclamações e manifestos - por telégrafo, telefone, rádio e alto-falante. Como traço singular, uma tela ao ar livre, iluminada à noite, deveria constantemente retransmitir as últimas notícias; uma projeção especial deveria ser instalada para que, em tempo nublado, pudesse lançar palavras no céu, anunciando o lema do dia.”

O projeto nunca foi executado. Os tempos eram de profunda penúria, pois a Rússia estava passando por um período de muita fome, causada pelos longos anos da guerra civil e dos ataques estrangeiros à recém-inaugurada nação soviética. Mas os artistas construtivistas eram férteis na criação de seus projetos.

Maquete do Monumento à III Internacional, de Vladimir Tatlin,
realizado entre 1919 e 1920
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quarta-feira, 10 de abril de 2013

Diário de Madrid VIII

Ontem fiquei sem internet. O wifi do lugar onde estou hospedada resolveu nao funcionar nunca mais. Estou digitando de um locutório e nao tem o til nos acentos deste teclado, entao tudo que for entao, nao, sertao, faisao, estao, sao, nao sao... vai ficar tudo assim mesmo, desculpem aí.

Mas ontem estive vendo a coleçao do Museu Thyssen-Bornemizsa, depois do curso intensivo que estou fazendo na Academia Decinti. Para uma coleçao particular, pertencente a úma só família e que montou esse acervo em duas geraçoes, desde o século XIX, a quantidade de obras para ver è muito grande. Eles têm um pouco de tudo: dos pintores italianos, holandeses, franceses, flamengos, espanhois, ingleses, norte-americanos e até austríacos, suecos, escandinavos e russos. Posso concluir que essa famìlia sabia do que estava acontecendo no mundo das artes e fez questao de adquirir obras de todas as fases importantes da pintura até o século XX.

A coleçao é feita de pinturas clàssicas, de representantes do romantismo, do realismo, do impressionismo, da Vanguarda Russa, das vanguardas europeias do começo do sèculo XX. Tem Kandinsky, Chagal, Max Ernst, Kasimir Malevich, Mondrian, Lucien Freud, John Singer Sargent, Francis Bacon, Edward Hoper e todos os outros mais conhecidos, Van Gogh, Gauguin, Toulouse-Lautrec, Monet, etc. É uma boa panorâmica da pintura dos últimos tempos, inclusive. Mas pára na dècada de 1940.

Para ver arte pós-década de 40 é bom ir a outro grande Museu daqui, o Reina Sofia, que já fui em outra viagem a Madrid e desta vez acho que posso ficar sem. Lembro-me que lá vi "A Guernica" de Picasso, várias outras obras dele, além de Salvador Dali, Miró e esculturas de Gaudi. Foi o que mais gostei. Porque o Reina Sofia está mais focado na Arte Contemporânea que no me gusta mucho...

Ficheiro:El Aquelarre.jpg
Uma das pinturas negras, de Francisco Goya
Gosto de ver os mestres de verdade: Diego Velázquez, José Ribera, El Greco, o grande Francisco Goya, Joaquín Sorolla - estes grandes espanhois que muito me encantam. Além dos outros que enchem meus olhos: hoje tive uma overdose de pintura! A riqueza da coleçao de pinturas do Museu do Prado - que fui ver hoje de novo - para terminar meu périplo por lá - é impressionante! Inúmeros quadros de Rubens, Tiziano, Rafael, Botticelli, os irmaos Carracci, Poussin... Inúmeros holandeses e alemaes, inúmeros espanhois, franceses... Anton Van Dyck, Rembrandt... dá para ficar com a alma feliz e os olhos escancarados por dias!

Mais uma vez fiz uns desenhos, especialmente de José de Ribera. Hoje tinham vários pintores com seus cavaletes pintando ao vivo, usando como referência essas maravilhas da arte. Fiquei com uma ponta de inveja destes artistas espanhois que podem a qualquer momento instalar-se dentro do Museu e pintar diretamente dos quadros dos mestres, beber direto na fonte.

Mas meu amigo Marcelo tinha me dado uma sugestao e preciso falar um pouco sobre isso. Marcelo, agora è para você que escrevo. Os espanhois, ah, os espanhois... Nunca tinha percebido, como agora, a expressividade desse povo! Velázquez, por exemplo, teve uma vida meio sem graça (se levarmos em conta a vida maluca de Caravaggio, por exemplo). Vivia na corte, com sua família, servia ao rei, pintava quando era solicitado, viajava para a Itália para comprar obras para o rei... algumas destas obras que hoje meus olhos puderam ver. O cara tinha tudo para ser um reles pintor de corte, de segunda linha. Mas nao! Cada tela que Velázquez pintou dizia muito sobre ele, sobre sua visao de mundo, sobre sua alma. As pinturas de Velázquez sao muito fortes, é impossível nao nos tocar um quadro como "A forja de Vulcano", ou até mesmo "Marte" e as figuras dos anoes e bobos da corte que ele elevou ao nível da pintura dos reis. Ele nao fez nenhuma diferença entre pintar, por exemplo, o retrato do rei Felipe ou moças que trabalham fiando, ou o cocheiro... Sua vida foi de uma pessoa normal? Sua pintura nao é absolutamente de uma pessoa normal! Ele parecia meio bobo, de tao tímido? Sua pintura grita, se escancara, será vista e admirada ainda durante muitos séculos!

El Greco, que se enfiou na pequena Toledo, tem uma pintura fantàstica, que com certeza deve ter inspirado Modigliani (nunca li sobre isso, mas quando vi as figuras esguias dele me lembrei de Modigliani). Sei que inspirou Francis Bacon e, sim, Susana, eu tambèm acho que Bacon deve ter se inspirado em El Greco tambèm. Ele usava tons escuros para as sombras, preto ou cinza. Quase nao tem sombras coloridas, os traços sao fortes, as figuras verticalizadas. Falava El Greco!

José de Ribera, Vicente López, Francisco Zurbarán, Murillo... falam da alma espanhola, da intensidade dos sentimentos que este povo é capaz de ter e sentir, da religiosidade que chega quase ao fanatismo, mas da vida nas ruas, nas casas, nas touradas, nas danças, no amor, no trabalho.

Francisco Goya... este tem me tocado muito ultimamente. Por inúmeras razoes e nem vou falar muito disso aqui agora, porque sei que este é um processo que está se dando e vamos ver aonde isso vai me levar. Acho que Goya me trouxe a esta viagem agora para a Espanha. Goya e Sorolla, os dois juntos, com suas diferenças, um o pintor da luz, o outro o pintor das trevas, mas nesta contradiçao me representam em meus altos e baixos, sobes e desces e os dois tem me falado muito nesta viagem. Sorolla, Goya...

As pinturas negras de Goya, que eu vi, revi e vi de novo no Prado sao de uma expressividade impressionante! Um homem que além de pintor se incomodava com os assuntos do seu país, do seu povo, que se envolveu com as lutas históricas de seu tempo, que pintou os desastres da guerra e a tela "O fusilamento de 3 de maio", mas também as "majas" desnuda e vestida, as gravuras e caricaturas que representavam os sentimentos humanos mais profundos... Francisco Goya é, para mim, uma grande referência.

Joaquín Sorolla, pintor realista do final do século XIX e começo do século XX, tinha como grande forma expressiva a explosao de luz que ele permitia surgir em seus quadros. Pintou muitas vezes na beira da praia, amarrando seu cavalete com cordas por causa do vento, unicamente porque sentia necessidade de trazer aquela luz para suas telas, aquelas pessoas andando na praia, os pescadores, as mulheres e principalmente as crianças. Todo o mundo de Sorolla é um mundo da relaçao com a luz. Ele tinha em sua palheta uma boa diversidade de tons de amarelo. E amava a pintura de Velázquez, aquele homem tímido cuja pintura nada tem de tímida.

Só para terminar, tambèm vi um outro pintor espanhol que me encantou muito: Mariano Fortuny. Quase nao é conhecido, mas é da mesma cepa que Sorolla. Fiz um desenho gestual de uma cópia que Mariano Fortuny fez de uma figura de Velázquez. Como a cópia dele é, por sua vez, uma grande obra, fiquei observando e minha observaçao me fez desenhar para entender melhor.

Ficheiro:Joaquín Sorolla 001.jpg
Um exemplo da luz de Joaquin Sorolla

terça-feira, 5 de março de 2013

Exercícios de desenho gestual

Hoje de manhã, no ateliê de Maurício Takiguthi, fiz estes exercícios de desenho gestual com carvão e lápis-carvão. A ideia é captar o essencial da figura, com marcação dos valores e leitura dos movimentos.

Para os três primeiros desenhos, usei como referência três pinturas do artista barroco alemão Christian Seybold, que nasceu em 19 de março de 1695 e morreu em Viena em 1768. O quarto desenho foi baseado numa fotografia do artista russo Aleksandr Rodtchenko, nascido em 1891, que participou do movimento artístico conhecido como Vanguarda Russa.

Desenho gestual com base numa pintura de Christian Seybold
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Desenho de gestual com base numa pintura de Christian Seybold
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Desenho de gestual com base numa pintura de Christian Seybold
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Desenho de gestual com base numa fotografia de Aleksandr Rodchenko

domingo, 16 de dezembro de 2012

Leonid Romanovich, o pintor bailarino

Galeria Tretyakov de Moscou, Rússia
Enquanto a presidenta Dilma Roussev passava pela Rússia esta semana, o Museu Tretyakov de Moscou apresentava várias grandes exposições. Sabemos que as artes plásticas na Rússia mostram como inúmeros pintores daquele país dominavam, e dominam até hoje, a técnica do óleo, da aquarela, do carvão, do simples desenho à grafite. Desde os primeiros pintores de ícones, em especial Andrei Rubliev - que teve um filme sobre sua vida feito por Andrei Tarkovsky - os artistas russos são impressionantes por sua sofisticada técnica que cria belíssimas obras de arte.

Mas nós, especialmente aqui no Brasil, pouco conhecemos sobre os artistas russos. Nosso conhecimento sobre as artes plásticas fica praticamente restrito à arte europeia e dos EUA. Sabemos pouco sobre a África, Ásia, Oceania e até mesmo sobre nossos artistas latino-americanos. A arte russa teve uma importância fundamental na história da arte, especialmente após o século XIX e princípios do século XX.


Fotografia de Leonid Romanovich na mostra da
Galeria Tretyakov, Moscou
Um destes artistas cujas pinturas estiveram em exposição em Moscou desde o dia 19 de outubro é Leonid Romanovich Astafiev, cuja arte sempre esteve ligada à cultura russa tradicional. A vanguarda russa foi um movimento artístico cultural muitíssimo importante não só para a cultura russa, mas para toda a cultura ocidental do século XX. Pudemos ver um pouco disso na exposição Virada Russa que ocorreu aqui no Brasil (São Paulo, Rio e Brasília) em 2009 (Leia mais aqui).

Um dos objetivos deste Blog é trazer informações e conhecimentos sobre todos os artistas que possamos conhecer e cuja qualidade artística seja relevante, sob nosso ponto de vista. Por isso, enquanto a presidenta do Brasil viajava por Moscou, fizemos uma busca do que de importante acontecia naquela cidade. Muitas exposições importantes ocorrem na Rússia. Escolhemos esta, pelo fato do artista ter sido bailarino e restaurador de obras de arte.


Flores, óleo sobre tela de Astafyev
Leonid Romanovich Astafyev nasceu em 1931, em uma família cuja história está ligada à Galeria Tetryakov de Moscou. Seu pai era restaurador na Galeria até pouco antes da II Guerra Mundial e por causa disso sua família morava em uma ala da galeria. Leonid cresceu em meio a este mundo de obras de arte, e os salões e oficinas que ocorriam lá era parte de sua realidade diária. A pintura tradicional russa foi formando sua percepção artística e ainda muito jovem ele já tinha pontos de vista bastante maduros sobre arte.

Em 1948 Leonid Romanovich Astafyev passou a estudar na Escola de Arte Regional de Moscou intitulada “Em memória de 1905”. Os tempos eram o da União Soviética. Muitos campos de interesse atraíam o jovem Leonid, mas tinha um interesse especial pelo balé, que acabou escolhendo como prática principal, deixando seu professor de pintura chateado, pois o rapaz era também um grande pintor de paisagens.

Após a formação na Escola de Arte Regional, Astafyev entra para uma classe experimental de dança da escola de coreografia do Teatro Bolshoi (atualmente Academia de Balé Bolshoi). Muitos queriam estudar lá, e os testes eram bem difíceis. Mas Leonid conseguiu e, de 1953 a 1956, ele frequentou as aulas de balé, assim como fazia estudos de História da Música e do Teatro. Essa experiência dentro do Teatro Bolshoi, segundo afirma o texto de apresentação no sítio da Galeria Tretyakov, influenciou a visão de arte de Leonid Romanovich.


Paisagem, de Astafyev
Mas ele também amava muito a pintura, e acabou mesmo se dedicando a ela. Em 1956 foi escolhido como restaurador no departamento de restaurações de imagens da Galeria Tretyakov, onde trabalhou até o fim da vida.

Os restauradores da Tretyakov são considerados grandes especialistas em arte, muitos deles trabalhando dezenas de anos só na restauração de pinturas. Pelas mãos de Astafyev passaram inúmeras obras para serem restauradas. Ele também acompanhava exposições de arte pelo país e no exterior. Com essas viagens, conheceu grande número de cidades da União Soviética de seu tempo, assim como inúmeros países. Conheceu e se tornou amigo de muitos restauradores, peritos, museólogos, artistas.

Como restaurador, ele aperfeiçoou e criou novas técnicas de restauração de obras de arte, que utilizou, por exemplo, na restauração da obra “Ivan o Terrível e seu filho”, do outro grande pintor russo Ilya Repin. Pela enorme qualidade de seu trabalho, Leonid Romanovich Astafyev ficou respeitado internacionalmente como restaurador. Por seu trabalho, foi premiado com a mais alta categoria de artista restaurador e recebeu também o prêmio “Trabalhador honrado da Cultura” da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, a ex-URSS.


Paisagem, de Astafyev
Mas Leonid Romanovich não era só um restaurador. Era um grande e talentoso artista. Pintores importantes da época, como I.I. Levitan, K.A. Korovin, V.D. Polenov e V. A. Serov foram seus professores.

Suas paisagens tranquilas nos mostram como o artista se deixava envolver pela beleza do mundo a seu redor. Beleza do mundo que para ele era a Arte, sob a qual girava sua vida desde seu nascimento.

A primeira exposição individual de Leonid Romanovich aconteceu na Galeria Tretyakov somente em 2005, após sua morte. Depois desta, mais três aconteceram em outros museus russos. Suas obras estão nos acervos da Galeria Tretyakov, no Museu Estatal de Darwin e no Museu Histórico-Artístico de Dolgoprudny, assim como na coleção da Embaixada Russa de Jacarta, Indonésia, e em coleções particulares.

Leonid Romanovich Astafyev morreu em 2004.


Paisagem em óleo de Leonid Romanovich Astafyev
Paisagem, óleo de Leonid Romanovich Astafyev

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A poesia solar de Maiakovski

Nesta última quarta-feira, 7 de novembro, na Livraria Arlequim, centro do Rio, foi lançado o livro “Vladimir Ilitch Lenin”, poema de Vladimir Maiakovski, com a presença de cerca de quarenta pessoas, entre intelectuais, artistas e amantes da literatura do poeta russo.
Paço Imperial, Rio de Janeiro

A Livraria Arlequim ocupa uma sala do famoso Paço Imperial, uma construção do final do século XVII, mais exatamente 1699. O prédio por onde passou a comitiva de Dom João VI, quando de sua vinda de Portugal para o Brasil, hoje recebe diversas exposições temporárias de artes visuais, além de ter a sua própria exposição permanente.

Dentro desse espaço, reuniram-se Zoia Prestes, Adalberto Monteiro, Alexei Bueno, Maria Prestes (viúva do líder comunista Luís Carlos Prestes), eu e umas quatro dezenas de pessoas para falar de poesia e de arte.

Adalberto, responsável pela edição do livro que saiu pela Editora Anita Garibaldi, com o apoio da Fundação Mauricio Grabois, fez uma apresentação do livro, ressaltando o fato de ser a primeira tradução em língua portuguesa do poema “Vladimir Ilitch Lenin” em sua totalidade. Disse ainda que esse poema ressoa, nos dias de hoje, as ideias futuristas de Maiakovski, um poeta que olhava para o porvir. Dedicando o poema ao líder da revolução russa de 1917, Lenin, Maiakovski “não endeusa, não faz culto à personalidade de Lenin, mas, pelo contrário, mostra um homem comum, ‘a pessoa mais terrestre’, que soube liderar um movimento que trouxe mudanças muito profundas, não só para a Rússia, mas para o mundo todo”, disse Adalberto Monteiro.
Zoia Prestes autografa o livro

Zoia Prestes, a responsável pela tradução direta do russo para a língua portuguesa, disse que essa tarefa dificílima de traduzir um poema de Maiakovski, apesar de complexa, trouxe-lhe também bastante satisfação pessoal, por causa de sua história com esse poeta. Ela viveu em Moscou entre 1970 e 1985, e em sua fase escolar participou de concursos de declamação de poesia e lembra que os livros de Maiakovski eram parte do currículo escolar da União Soviética. Em um desses concursos, ganhou como prêmio um exemplar desse poema em russo, que ela guarda até hoje. Na tradução do poema, Zoia Prestes diz que resolveu priorizar o significado das palavras, mantendo a mesma disposição formal escolhida pelo poeta russo, com versos escalonados. E completou dizendo que o fato de ter vivido tanto tempo na Rússia, onde recebeu educação escolar e superior, traz consigo esse amor à cultura russa e ao povo russo, o que também foi um importante componente no momento de traduzir este poema.

Lançamento no Rio de Janeiro
Alexei Bueno, poeta, editor e crítico literário, também expôs suas opiniões sobre o livro. Profundo conhecedor de poesia, disse que a de Maiakovski reflete a riqueza cultural do povo russo, que também gerou os gênios do cinema, Sergei Einseinstein, Andrei Tarkovski, entre outros. Os artistas russos, ressaltou Bueno, foram e são ainda referências para os artistas de hoje em todo o mundo. Ele elogiou a iniciativa da tradução desse poema em língua portuguesa e todo o esforço da equipe responsável pela execução dessa obra.

Mazé Leite, a artista responsável pelo projeto gráfico e pelas ilustrações, fez uma breve explanação sobre seu trabalho. Ressaltou que se inspirou nos artistas da vanguarda russa, citando alguns nomes como Natalia Gontcharova, Vladimir Tatlin, Kasimir Malievitch e Alexandr Rodtchenko. Explicou que a ideia para uma capa com tons quentes e vibrantes ela foi buscar na imagem do Sol, um tema bastante recorrente na obra de Maiakovski. Além do poema em si, disse ela, porque apesar de ter sido escrito para lamentar a morte de Lenin, o poema na verdade é uma ode à vida.
Vladimir Maiakovski,
fotografado por Alexandr
Rodtchenko

Após essas primeiras intervenções, outras pessoas presentes também participaram do bate-papo, como Maria Prestes, que contou diversas histórias dos tempos em que ela com o marido, Luis Carlos Prestes, e nove filhos, se mudaram para Moscou, fugindo da ditadura militar no Brasil. Maria Prestes é a mãe de Zoia.

A noite encerrou com um coquetel e muita conversa sobre poesia e sobre arte.

O livro “Vladimir Ilitch Lenin”, de Maiakovski, já teve seu primeiro lançamento em São Paulo. O próximo encontro em torno do poema será no dia 21 de novembro, no Centro Cultural Vergueiro, às 19h30, na Sala de Debates.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Um poema de Maiakovski

Desenho baseado em fotografia de Alexandr Rodtchenko
Capa do livro

Há quase um ano, um amigo, Adalberto Monteiro, me fez um convite: apresentar um projeto gráfico e fazer ilustrações para o poema "Vladimir Ilitch Lenin", do poeta russo Vladimir Maiakovski. O projeto era grande: pela primeira vez, o poema estava sendo traduzido diretamente da língua russa para a nossa língua portuguesa, por Zoia Prestes, pedagoga e tradutora brasileira com formação acadêmica em Moscou.

Aguardei a tradução ficar pronta para começar a trabalhar, mas depois de alguns dias de pesquisa, já havia resolvido a direção que tomaria: iria me inspirar na estética da Vanguarda Russa. Inclusive para homenagear o próprio Maiakovski que era parte ativa dos grandes artistas e intelectuais que formaram um movimento de modernização da vida russa: adeptos da Revolução Socialista de 1917, eles conjuminaram suas pesquisas e experiências artísticas com as ideias de um novo mundo que eram defendidas pelo líder do movimento operário, Vladimir Ilitch Lenin.

O poeta Maiakovski, carvão sobre papel cartão
Li o poema algumas vezes antes de começar a trabalhar. Acontece uma coisa com este poema, assim como com outros de Maiakovski. Entre eles o famoso poema ao Sol, onde ele criou a frase "Gente é pra brilhar", repetida por Caetano Velloso, nos bons tempos em que Caetano tinha esperança no futuro (pois o mundo que ele enxerga hoje é um mundo triste)...

Mas neste e em outros poemas do Maiakovski -  eu dizia - algo acontece: o poema vai crescendo dentro da gente, vai ocupando espaços, vai se avolumando, como se nos inflasse junto com ele. O resultado disso é que ao final da leitura já não somos mais do tamanho que éramos quando começamos a leitura. A gente alcança um tamanho maior. A gente se agiganta, porque a poesia de Maiakovski vai construindo edifícios dentro de nós...

O poema devia ser sobre a morte, sobre a morte de Vladimir Ilitch Lenin. Mas, longe disso, o poema trata de vida! É um poema sobre a Vida. Vida que ele inspira e que nos faz de novo erguer-nos sobre nossos pés - e nossas crenças - e dizer para nós mesmos, no mínimo: há algo muito grande aí atrás desses versos aparentemente desconexos. Talvez esse "algo" se chame Futuro e traga uma luz especial dentro dele...

No processo de construção das ilustrações, pensei em homenagear alguns artistas russos. Alguns do final do século XIX, como Ilya Repin, pintor realista que me inspirou o desenho à direita. Outros do começo do século XX, como Natalia Gontcharova. Sobre uma de suas pinturas, fiz o desenho abaixo. Mas também fui buscar inspiração em outros como Malievitch, Vladimir Tatlin, Rodtchenko. Aqui, uma pequena parte do meu trabalho que está ilustrando o livro "Vladimir Ilitch Lenin".
Lançamento do livro
VLADIMIR ILITCH LENIN
Dia 5 de setembro de 2012, às 19h30
No Espaço revista CULT
Rua Inácio Pereira da Rocha, 400 Pinheiros - São Paulo

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Um Modigliani inquieto

Modigliani: O pequeno camponês, 1918
O Museu de Arte de São Paulo – MASP – está apresentando uma exposição bastante reduzida sobre a obra do pintor italiano Amedeo Modigliani, intitulada "Modigliani: Imagens de uma Vida". São apenas 11 pinturas do artista, mais algumas de outros seus contemporâneos e alguns desenhos. Fui ao MASP com a intenção de ver de perto a arte de Modigliani, mas infelizmente não saí satisfeita.

A exposição vinha sendo preparada há dois anos. Passou primeiro pela China, vindo depois ao Brasil. Os moradores do Rio de Janeiro tiveram mais sorte, pois a mesma exposição foi apresentada lá no Museu Nacional de Belas Artes, com 166 peças. Depois foi para Vitória, ES, com 150 obras e depois da exibição no Masp, seguirá para o Museu Oscar Niemeyer em Curitiba.


Os organizadores da exposição aqui em São Paulo apontam a falta de espaço, no MASP, para que viessem mais obras. Nós, moradores desta cidade, que costumamos frequentar eventos artísticos,sabemos que ainda falta espaços culturais aqui para grandes mostras de artes, ou mesmo para grandes espetáculos musicais ou teatrais. Os poucos espaços que temos – quase restritos ao MASP, Pinacoteca, MAM e MAC – estão ficando cada vez mais exíguos num momento em que vemos que o Brasil tem sido cada vez mais um polo de atração para grandes mostras de artes.



Saí, portanto, decepcionada da exposição, que preencheu as lacunas com muitos textos e fotos impressas de obras originais, numa intenção de traçar uma linha do tempo da obra de Amedeo Modigliani. Resolvi complementar minha visita ao MASP, subindo até o segundo andar e ver de novo as obras do acervo, onde constam também duas pinturas desse artista italiano.A exposição que vi aqui no MASP dá apenas uma pálida ideia de quem foi esse artista.


Biografia



Amedeo Modigliani
Amedeo Modigliani nasceu no dia 12 de julho de 1884, em Livorno, na Itália. Era o mais novo de quatro filhos de Flaminio e Eugénie Modigliani. Sua família, mesmo sendo de origem burguesa judaica, estava em situação muito precária, quando ele nasceu. Uma crise econômica na Itália alcançou a empresa da família Modigliani, que faliu. Sua mãe, para ajudar no sustento dos filhos, teve que dar aulas particulares e fazer traduções de textos.
Com 14 anos de Idade, Amedeo Modigliani é acometido de febre tifoide. Sua saúde foi frágil a vida toda. Nesse período, ele abandona cada vez mais a escola e se interessa pelo desenho. Se inscreveu na Academia de Arte de Livorno e teve lições de pintura com Guglielmo Michelli. Seu irmão mais velho Emanuele foi mandado para a prisão por causa de suas atividades políticas. Mais tarde ele virá a ser uma das principais lideranças do Partido Socialista Italiano.
Em 1900, Amedeo adquire uma tuberculose que faz com que ele passe o inverno em Nápoles, Capri e Roma. Em 1902, se inscreveu na Scuola Libera di Nudo de Florença. Nessa cidade, visita os museus e as igrejas com a finalidade de estudar a arte do Renascimento. No ano seguinte vai com seu amigo Oscar Ghiglia para Veneza e se matricula no Istituto di Belle Arti di Venezia e participa de aulas de modelo vivo. E mais uma vez, em museus e igrejas, faz estudos intensos sobre as obras dos antigos mestres.
Em 1906, Modigliani se muda para Paris, se instalando num pequeno apartamento no bairro de Montmartre, onde moravam inúmeros outros artistas. Lá começou a frequentar as aulas de modelo-vivo da Académie Colarossi. Vive uma vida boêmia, embriagando-se todas as noites, fumando haxixe, frequentando os cabarés de Paris. Sua pobreza era extrema, e ele mal tinha o que comer. Muitas vezes só podia pagar para comer e beber, desenhando retratos de clientes nos bares de Montmartre e Montparnasse.
Modigliani
Um médico jovem, Paul Alexandre, junta-se com o irmão e alugam uma casa para apoiar jovens artistas, entre eles Amedeo Modigliani. Compraram dele quadros e desenhos e conseguiram umas encomendas de retratos. No Salão de Outono de 1907, o pintor já participa com algumas obras. Foi a uma retrospectiva da obra de Paul Cézanne, que o deixou bastante impressionado.
Aqueles eram tempos de mudanças profundas nas artes plásticas. Desde o realismo de Gustave Courbet, que trouxe novidades revolucionárias ao velho classicismo francês, dando inspiração a movimentos como o dos Impressionistas, pintores e escultores faziam novos e muitos experimentos artísticos. Paris era o celeiro maior da pintura moderna no mundo. O pintor francês Toulouse-Lautrec frequentava os cabarés parisienses pintando as cenas que observava, deixando uma marca muito própria na pintura. Por outro lado, na Alemanha, Edvard Munch, um pintor norueguês, dava os primeiros toques para o surgimento do movimento expressionista alemão.
Modigliani vive em meio a essas mudanças. Trabalha com afinco em suas pesquisas na pintura, assim como é um ativo frequentador da vida boêmia de Paris, mesmo com uma saúde muito frágil. Muda de casa várias vezes e frequenta diariamente o cabaré “Le Lapin Agile”, de Montmartre, aonde iam também seus colegas de profissão, como Pablo Picasso, Juan Gris, Van Dongen, entre outros, e os escritores André Salmon e Guillaume Apollinaire.
Ele também era amigo de artistas como Marc Chagall, Chaïm Soutine, Blaise Cendrars e Diego Rivera, mais tarde.
Modigliani: Jovem mulher de olhos azuis
No bairro de Montparnasse, também em Paris, conhecido local de moradia e estudo de artistas de vanguarda, conviviam artistas, intelectuais, boêmios e aqueles que pregavam a vida em comunidade.
Modigliani era também um conquistador.
Sua primeira grande paixão foi por uma lavadeira loira, chamada Maud, que posou para ele como modelo. Mas outras moças passaram pela vida dele: Gilberte, Elvire, Lola... Em 1910, vagando pelas ruas, Modigliani encontra no Quartier Latin com a poetisa russa Anna Achmatova, com quem ele mantém um relacionamento turbulento, que durou dois anos. Em 1914, outra mulher entra na vida de Amedeo: Beatrice Hastings. Com ela, ele viveu uma paixão violenta, agressiva, permeada de brigas, em meio ao álcool ao haxixe. Mesmo assim, Beatrice tenta impor a ele um ritmo mais contínuo de trabalho.
Ao mesmo tempo ele mantém uma relação com Simone Thiroux, que fica grávida e tem um filho dele. Mas foi 1916 que ele conheceu Jeanne Hébuterne, que tinha 19 anos e estudava na Académie Colarossi. Ele vai morar com ela na Rue de La Grande Chaumière, onde fica a famosa academia de arte.
No dia 24 de janeiro de 1920, morreu Amedeo Modigliani, no Charité de Paris, com 35 anos de idade. Estava tuberculoso, pobre e enfraquecido por uma vida inteira de dedicação à arte. Ele tinha se convertido no artista sofredor de Paris, um pintor que não poupava nem sua saúde frágil na criação de suas obras. Sua companheira Jeanne, grávida de 8 meses, não suportou a perda do amado e atirou-se do quinto andar do prédio onde moravam, no dia seguinte.
Modigliani deixou uma grande. Suas figuras alongadas são sua marca pessoal e seu modo de mostrar ao mundo a sua forma individual de ver pessoas e coisas. Pescoços longos, verticalizados, sustentam rostos um tanto entristecidos, olhares opacos. As cores são chapadas, as pinceladas lineares. Fez parte de um momento onde o artista como ser humano buscava experimentar novas formas de ver e de pintar o mundo. Aquilo era tudo novo, mas tudo parte de um momento histórico específico. A humanidade vivia os preparativos de duas guerras sanguinárias e mudanças revolucionavam vários países do mundo, como a Rússia. O indivíduo buscava seu lugar em meio aos redemoinhos incansáveis e contsantes do espírito daquela época.
Modigliani: Nu em vermelho, 1917
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Serviço:
MODIGLIANI - IMAGENS DE UMA VIDA
MASP - Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand
Avenida Paulista, 1578 São Paulo
De 3ªs a domingos e feriados, das 11h às 18h. Às 5ªs: das 11h às 20h. 
Ingressos: R$ 15,00 (Estudantes, professores e aposentados: meia-entrada)Às 3ªs feiras: acesso gratuito a todos