"Nighthawks" (Aves noturnas), Edward Hopper, 1941, óleo sobre tela, 152 x 84 cm |
“Nighthawks, aves noturnas, falcões notívagos, gaviões da noite, essa gente que, como nós, se distrai e é engolida pelo vazio em uma noite deslocada do tempo, em que tudo pode acontecer, inclusive nada.
(...)
- Vai ver foi. Numa noite dessas, não descreio de nada, nem de alçapões, nem de vazios emolientes, nem de mortos que pintam vazios às altas horas da madrugada.”
Um de seus desenhos expostos no Whitney Museum |
Edward Hopper foi um pintor realista norte-americano. Mais conhecido por suas pinturas a óleo, ele também foi aquarelista e gravador. Em suas cenas urbanas e rurais, e também nas pessoas solitárias de muitos de seus quadros, vemos refletida a sua visão pessoal da vida moderna. Aquela melancolia de fim de tarde, até certo ponto "aliviada" pelos encontros sociais após o expediente (os happy-hours), o peso na alma, a angústia que às vezes faz doer o corpo físico, coisas assim estão presentes na obra deste taciturno artista norte-americano que se manteve fiel ao realismo até o fim da vida.
Para quem quisesse compreender qual era o motor que lhe inspirava a pintar, Edward um dia respondeu: “A resposta toda está lá na tela.”
Quem foi Edward Hopper
Autorretrato, 1925-30, óleo s/ tela |
Hopper foi um aluno aplicado e mostrou talento para o desenho desde cedo. Recebeu muita influência de seu pai, um intelectual que amava as culturas russa e francesa. Desde cedo, seus pais encorajaram a sua arte, fornecendo-lhes materiais artísticos, revistas e livros de arte. Na adolescência, Hopper já trabalhava bastante, desenhando com materiais diversos, como carvão, e pintando aquarelas e quadros a óleo. Também já fazia charges políticas. Com apenas 13 anos, em 1895, assinou sua primeira pintura a óleo, que ele intitulou “Barco a remo em Rocky Cove”. Nessa época ele já se interessava muito pelos temas marítimos. Chegou mesmo a pensar em seguir uma carreira ligada à marinha, mas logo após sua formatura resolveu seguir carreira artística.
Desenho de Edward Hopper |
Outro de seus professores foi o também artista realista Robert Henri, que dizia que arte e vida devem caminhar juntos. Henri incentivava seus alunos a usar sua arte para "agitar o mundo". E dizia: "Não é o tema que conta, mas o que você sente a respeito dele". Dessa maneira, Hopper foi sendo influenciado por seus mestres, que incluiram também os notáveis artistas George Bellows e Rockwell Kent. Alguns deles, incluindo o próprio Robert Henri, se tornaram membros da "The Eight", também conhecida como Escola Ashcan de Arte Americana.
A Escola Ashcan foi um movimento artístico no Estados Unidos do início do século XX, conhecida por retratar as cenas do cotidiano em New York, principalmente a vida nos bairros mais pobres da cidade. Os artistas mais famosos que trabalharam neste estilo incluía Robert Henri (1865-1929), George Luks (1867-1933), William Glackens (1870-1938), John Sloan (1871-1951), e Everett Shinn (1876-1953), alguns dos quais se conheceram estudando juntos sob a orientação do renomado pintor realista Thomas Anshutz na Academia Pensilvania de Belas Artes. Outros deles se reuniam na redação do jornal da Filadélfia, onde trabalharam como ilustradores.
Estudo para "Nighthawks" |
Hopper, portanto, amadureceu como pintor em meio a essas ideias. Durante seus anos como estudante, ele pintou dezenas de nus, estudos de natureza-morta, paisagens e retratos, incluindo seus autorretratos.
"Sombras da noite", gravura de Edward Hopper |
Hopper fez três viagens à Europa, concentrando-se em Paris, onde ele queria aprofundar seus estudos de pintura, assim como o fizeram dezenas de outros seus conterrâneos antes e depois dele. Mas lá estudava sozinho e não parecia muito influenciado pelas novidades da arte daquele período. Mais tarde, ele disse que não se lembrava de ter ouvido falar de Picasso nenhuma vez. Mas tinha ficado muito impressionado com Rembrandt, principalmente pelo quadro “Ronda noturna” que ele disse que foi "a coisa mais maravilhosa que já tinha visto”.
Após esse contato com as telas de Rembrandt, Hopper começou a pintar cenas urbanas usando uma paleta com tons escuros. Ainda experimentou uma paleta clara como as dos impressionistas, mas voltou às cores escuras, com as quais ele se sentia mais confortável. Hopper passou a maior parte de seu tempo em Paris desenhando ruas e cenas nos cafés. Também ia ao teatro. Diferentemente de muitos de seus contemporâneos que imitavam as abstrações cubistas, ele escolheu continuar na linha da arte realista.
"Soir bleu", Edward Hopper, óleo sobre tela |
Estudo para "No escritório, à noite" |
No ano seguinte, recebeu uma encomenda para fazer ilustrações para alguns cartazes de filmes e de publicidade para uma empresa de cinema. Mesmo que ele não gostasse desse trabalho, Hopper adorava teatro e cinema, que acabaram sendo também temas para suas pinturas e influenciaram a composição de seus quadros. Em 1915, voltou-se para a gravura e produziu cerca de 70 obras. Quando podia, fazia também aquarelas ao ar livre.
Edward Hopper |
Em 1923, conheceu sua futura esposa Josephine Nivison, artista e também ex-aluna de Robert Henri. Casaram-se um ano depois.
O artista voltou-se mais uma vez para pintar e desenhar a arquitetura norte-americana, tanto urbana quanto rural. Aos quarenta e um anos, Hopper já vivia de seu trabalho de pintura.
Continuava um homem recluso, de poucas palavras, taciturno, um tanto melancólico. Vivia uma vida simples, longe dos eventos sociais que já lhe davam fama. Passou pela década de 1930 produzindo muito. Durante a década de 1940, passou um período de relativa inatividade, mas foi quando pintou um de seus quadros mais famosos, o "Nighthawks" acima. Passou por vários problemas de saúde. Na década de 1950 e início de 1960, criou várias de suas obras mais importantes, entre elas “Primeira fila da orquestra” (1951); “Manhã de sol” ; “Hotel by a Railroad”, 1952; “Intervalo”, em 1963.
"Autòmato", 1927, óleo s/ tela |
Sua pintura desde o início reflete seu interesse na tradição dos mestres holandeses, especialmente Rembrandt e Franz Hals e, dos franceses, seu fascínio por Édouard Manet. Paisagista e interessado em pintar casas e prédios, Hopper se interessou muito também pela imagem da mulher. Em muitos de seus quadros, mulheres solitárias, muitas vezes nuas, parecem representar a solidão humana diante de um mundo que crescia muito e que parecia engolir o sujeito. Sua mulher também foi modelo para suas pinturas muitas vezes.
Hopper morreu em sua casa, em Nova York em 15 de maio de 1967. Sua esposa, que morreu dez meses depois, doou sua coleção com mais de três mil obras para o Museu Whitney de Arte Americana.
Edward Hopper manteve-se fiel a seu estilo figurativo e realista, como o fizeram tantos outros pintores, norte-americanos ou não, entre eles Lucian Freud. Ele se manteve coerente a uma máxima de Wolgang von Goethe, a qual citava e concordava:
"O início e o fim de qualquer atividade artística é a reprodução do mundo à minha volta através do mundo dentro de mim..."
"Moça costurando", Edward Hopper, 1921, óleo sobre tela |
Gostei da 'aula de Hopper', Mazé. Vi pouco, um quadro ou dois na minha vida inteira. Gostaria demais de ver mais de perto. Vou pensando em contraponto com o que andei vendo ultimamente (Lucien Freud).
ResponderExcluirVou aprendendo, with a little help of my friends, como você. Obrigada pela generosidade!
Susana
As personagens de Hopper estão sempre cercadas de vazio e silêncio. Elas transferem para a atmosfera sonolenta que as envolve o calor de sua profunda humanidade - o que não disfarça a evidência de que esse vazio, esse silêncio, essa malancolia são emanações, prolongamentos delas mesmas.
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