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segunda-feira, 22 de junho de 2015

Francisco de Zurbarán, um novo olhar

Detalhe de natureza-morta de Zurbarán
Autorretrato
O Museo Thyssen-Bornemisza de Madrid, Espanha, está apresentando, desde 9 de junho, uma exposição retrospectiva da obra do pintor espanhol Francisco de Zurbarán, intitulada "Zurbarán, una nueva mirada". Ele é um dos pintores mais importantes do Século de Ouro espanhol. O museu conseguiu juntar, entre as obras expostas, aquelas que são pouco conhecidas e mesmo as que nunca haviam sido expostas na Espanha. Ele foi colega de Diego Velázquez e, junto com ele, tem sido muito reconhecido nos dias atuais pela qualidade de sua pintura e pelo seu estilo sensível de pintar.


"Santa Margarida", Zurbarán, 1631,
National Gallery de Londres
Francisco de Zurbarán nasceu em 7 de novembro de 1598, na pequena vila de Fuente de Cantos, em Badajoz, região da Extremadura.

Entre 1614 e 1617 estudou pintura em Sevilha com Pedro Díaz de Villanueva. Conheceu, no mesmo período, os famosos - na época - mestres de Diego Velázquez, Francisco Herrera e Francisco Pacheco. Fez amizade com Velázquez e Alonso Cano, seus contemporâneos, e ainda jovens aprendizes como ele. Após alguns anos de aprendizagem fecunda em diversas áreas, Zurbarán voltou para sua cidade natal, sem se submeter ao exame profissional do grêmio sevilhano de pintores. Isso acabou sendo lhe cobrado mais tarde.

Depois de um tempo em sua terra, Zurbarán mudou-se para Llerena, onde viveu de 1617 a 1628. Se casou e teve o primeiro filho ainda muito jovem. E já recebia muitas encomendas para pinturas em conventos e igrejas. Infelizmente, todas as pinturas da primeira etapa do pintor Zurbarán foram perdidas. Ele também recebeu encomendas vindas dos padres dominicanos de Sevilha, assim como de outros clérigos daquela cidade. Em duas cenas da vida de São Domingos, que está na igreja de Santa Madalena em Sevilha, os estudiosos de sua obra observam que há a presença de diversos assistentes do pintor, o que era razoavelmente comum, quando se tratava de pintar obras em formato grande.


A partir de 1629, oficialmente convidado pelo conselho municipal de Sevilha, ele se instala definitivamente naquela linda cidade da Andaluzia. No mesmo ano, pintou quatro telas importantes para o colégio de São Boaventura, telas estas que atualmente se encontram em museus da França e da Alemanha. Começo, então, o período mais rico de sua carreira. Com uma pincelada forte e expressiva e seguindo à risca os desejos dos seus clientes católicos, Zurbarán era, por isso, muito procurado para ilustrar cenas religiosas pelos clérigos da Contra-Reforma espanhola, em pleno século de ouro espanhol. Todos os clérigos da Andaluzia e Extremadura lhe procuravam: os jesuítas, os dominicanos, carmelitas, trinitários, etc. 

Com tanto prestígio, acabou sendo convidado, em 1634, para participar da decoração do grande salão do palácio do Bom Retiro em Madrid. Diz-se que talvez isto tenha sido sugerido por Velázquez, seu amigo. Lá, ele foi responsável pela pintura dos “Trabalhos de Hércules”, além de duas telas grandes com temas históricos. Estas telas estão no Museu do Prado, que pude observar de perto em minha última viagem a Madrid, neste mês de maio.


De volta a Sevilha, Zurbarán continuou seu trabalho para os padres. Quase todas as pinturas desta época estão bem conservadas e espalhadas por vários museus do mundo, dos Estados Unidos à Polônia.

Eu pude ver de perto no Museu de Belas Artes de Sevilha várias pinturas de Zurbarán, entre elas três telas que foram feitas para a sacristia da igreja de Santa Maria de las Cuevas.  A pintura de Zurbarán possui uma grande plasticidade nas formas, uma forma de distribuir as luzes de uma maneira que cria harmonia entre as diversas tonalidades. Ele foi um dos pintores que recebeu influência de José Ribera, e por isso grande parte de seu trabalho é bastante marcado por um estilo “tenebrista” (com fortes sombras bem marcadas).

Depois de 1650, Sevilha, que até então era uma cidade muito próspera que atraía comerciantes e artistas de vários lugares, passou por uma profunda crise econômica. Ainda por cima, milhares de pessoas morreram na crise da Peste de 1649. A cidade foi reduzida pela metade. O filho de Zurbarán, que era seu principal colaborador na pintura, também morre. As encomendas rarearam. Por outro lado, uma série de ordens religiosas que estavam se estabelecendo no “novo mundo”, nas Américas, começaram a lhe enviar solicitações para pinturas. Sem poder mais viver em Sevilha, Zurbarán mudou-se para Madrid em 1658. Levou com ele sua terceira esposa e a única filha sobrevivente à peste (teve três filhos). Em sua última etapa, Zurbarán pintou pequenas telas, executadas de forma muito refinada. Sempre com temas de devoção religiosa. Sua pincelada estava mais suave.


"São Francisco com a caveira nas mãos",
Zurbarán, óleo sobre tela, 1658
Envelhecido e doente, Zurbarán pintou sua última tela em 1662. Morreu em 1664 em Madrid, após uma longa enfermidade que lhe fez gastar todo o dinheiro recebido nas encomendas e que estava guardado. Deixou sua família empobrecida, mas sem nenhuma dívida.

Em sua obra nota-se que ele, mais do que nenhum outro, soube retratar a vida monástica com grande realismo e muita sensibilidade. Seus monges são de um realismo que até hoje impressionam; assim como é incrível como ele pintou monges em estado de êxtase, meninos santos, moças onde se vê seus olhares inocentes e cândidos, sem teatralidade, sem exagero, simples… Não criou espaços imaginários, não fez escorços, resolveu tudo de forma simples. Suas composições, sim, são muito bem pensadas, calculadas. A espessura dos tecidos que ele pinta são muito reais, assim como as dobras dos tecidos, que ele trabalhava paciente e majestosamente. Até mesmo suas naturezas-mortas as mais simples são profundamente poéticas, sublimes, porque ele dava a elas a mesma atenção dadas aos temas mais sagrados. Zurbarán é comovente!

Termino mais uma vez citando o poema de Théophile Gautier, de 1845:

“Monges de Zurbarán, brancos cartuchos que, na sombra
passais silenciosos sobre as lousas dos mortos
murmurando o “Pater” e as “Ave” sem nome.
Que crime expiais para tanto tormento
fantasmas tonsurados, verdugos pálidos…
para tratá-los assim, que foi feito de teu corpo?”

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Mais algumas imagens de pinturas de Francisco de Zurbarán:


Detalhe de pintura de Zurbarán
Detalhe de pintura de Zurbarán
Natureza-morta de Zurbarán
"São Serápio", Zurbarán, 1628, Museu de Conectcut, EUA
"Defesa de Cádiz contra os ingleses", Zurbarán, 1634, Museu do Prado
"Aparição de São Pedro a São Pedro Nolasco", Zurbarán, 1629, Museu do Prado
"São Hugo no refeitório dos cartuxos", Zurbarán, 1630-35, Museu de Belas Artes de Sevilha
"Sagrada família", de Zurbarán

domingo, 7 de abril de 2013

Diário de Madrid V



O sábado amanheceu ensolarado. Finalmente o sol apareceu! O cèu está muito azul, mas o frio è congelante. A gente se encolhe ao caminhar pelas ruas, enfiando o nariz embaixo do cachecol...

Mesmo assim as ruas estao cheias de gente. Muitos turistas descendo a Gran Via em direçao ao Paseo del Prado, e parecia uma procissao de gente descendo na mesma direçao. Varios grupos, casais, pessoas sozinhas.
Fui para o Museu Thyssen-Bornemizsa, que guarda uma das maiores coleçoes particulares de obras de arte. São da familia de Heinrich (1875-1947) e Hans Heinrich Thyssen-Bornemizsa (1921-2002). O Museu foi inaugurado em 1992 e uma grande parte de seu acervo foi adquirido pela Estado. Há obras do sèculo XIII até da década de 1940. Uma riquìssima coleçao de obras de arte que irei ver logo.

Mas resolvi ver antes a exposiçao "Impressionismo - pintura ao ar livre", uma exposiçao temporaria que reune obras do acervo de museus os mais variados, de diversos paises da Europa e dos EUA. Como sei que é muito dificil ver todas essas obras juntas, fui vê-la. De Camille Corot até Van Gogh, passando por Claude Monet, Sisley, Rousseau e Gustave Courbet, esta mostra apresenta pinturas que foram feitas a partir da influencia da Escola de Barbizon, formada por um grupo de pintores que resolveu ir para o campo, pintar ao ar livre, fora dos ateliês.

Trata-se entao de paisagens. A ideia era pintar os efeitos da luz solar sobre a natureza. Muitos deles fizeram experiencias, pintando a mesma cena em momentos diferentes do dia para captar as nunaces de luz que se modificam com a passagem do tempo. Um deles recomenda que se pinte em duas horas uma cena dessas, ou se for no por do sol, no máximo em meia hora...

Como a quantidade de pessoas querendo ver a exposiçao era muito grande, a organizaçao resolveu fazer a entrada por horários marcados. Mesmo assim era incomodo a disputa para ver os quadros. Havia oito de Gustave Courbet, entre paisagens rochosas, marìtimas, florestas e nuvens. Gosto muito deste pintor francës, um dos fundadores da Escola Realista. Mas la tambem estavam Joaquin Sorolla, Cézanne, Wiiliam Turner (que eu so tinha visto pessoalmente uma vez, no Louvre) e o alemao Adolf Menzel, pintor realista do qual vi uma bela exposiçao de suas pinturas em minha viagem a Berlim em 2010.

Deixei para ver o rico acervo do Thyssen depois, quando tiver menos gente. Fui em direçao ao Museu do Prado. Em frente ao predio, barracas onde pintores vendiam seus quadros, destes que encontramos na Praça da Republica em Sao Paulo, ou na pracinha atrás de Sacre-Coeur em Montmartre, Paris. Eles pintam o que os turistas gostam de comprar. Aqui, cenas locais com touradas, Dom Quixote, espanholas coloridas e suas castanholas. Também retratistas estavam lá oferecendo de desenhar os turistas por 10 euros.

Na igreja de São Jeronimo, ao lado, vi uma cena interessante: um grupo de pessoas vestidas para festa se acotovelava para serem fotografadas ao lado de... um casal de noivos! Os ombros dela estavam nus pois usava um vestido tomara-que-caia. Fiquei com pena dela, neste frio... Ela deve ter marcado a data de casamento e nem imaginava que no mës de abril estivesse tao frio em Madrid! Porque este frio nao é muito comum nesta época...


Segui meu caminho.

Passei em frente à estação Atocha, a estação central dos trens de Madrid. De Atocha saem todos os trens para qualquer região da Espanha e fora dela. Foi daqui que parti diversas vezes para conhecer outras cidades em minha primeira viagem para cá. Lembrei do atentado de uns 4 anos atrás, na Atocha, com muitos mortos. Hoje tem um monumento que os homenageia.

Passei na porta do Reina Sofia, o Museu de Arte Contemporânea. Como da primeira vez vim duas vezes conhecer seu acervo, desta vez vou priorizar os outros. Vi a parte nova do Museu inaugurada recentemente e bem moderna. Um bloco em vermelho, com uma forma um tanto orgânica. Vi também a escultura de Gaudí, que já tinha visto antes.

Caminhei em direção à Plaza de Lavapiés. Lavapiés era um antigo bairro judeu que foi ocupado por imigrantes de todas as partes do mundo. Caminhando pela rua, mesas com cadeiras nas calçadas em frente aos botecos, cheias de gente mais jovem. E muitas pessoas de todas as cores passando por mim. Vi muitos negros e muitos latinos. Mas pensei que com esta crise atual a Espanha não deve mais oferecer muito atrativo para os de fora que procuram por melhores condições de vida. E principalmente por trabalho, pois o desemprego aqui é muito grande, quase um terço da população trabalhadora.

Terminei meu dia encontrando um amigo brasileiro que está de passagem por Madrid e está viajando de mochila pela Europa por três meses. Fomos até o restaurante Miau na Plaza de Santa Ana jantar e tomar vinho. E o Leonardo me contou todas as aventuras deste primeiro mês de viagem, sozinho, descendo de Paris pela costa oeste, passando pela Galícia, depois Portugal, Andaluzia. Agora está indo para Barcelona. Seu objetivo é chegar a Istambul, na Turquia, em um mês e meio.