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sexta-feira, 29 de maio de 2020

TEMPO CINZA 11

Hoje é só mais um dia de frio na alma, mas deixo o poeta falar:

"Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a pôr umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
(...)"

Fernando Pessoa

Obra: À JANELA, Alexandr Romanychev, 1968


terça-feira, 26 de maio de 2020

TEMPO CINZA 10

Obra: VELHO NU AO SOL, Mariano Fortuny, 1863
São Paulo, a maior cidade da América do Sul, tem 25 mil pessoas morando na rua.

São crianças, são adolescentes, são mulheres, são homens. E uma grande quantidade de idosos.

Para eles, além de casa, falta tudo. E falta proteção contra o vírus que ameaça agora principalmente os mais pobres e os excluídos da vida.

sábado, 23 de maio de 2020

sexta-feira, 22 de maio de 2020

TEMPO CINZA 8

Hoje foi divulgado um vídeo de uma reunião governamental onde se escarram palavrões e ameaças. De morte, inclusive. Babando, o ódio escorre da boca do maldito presidente da república federativa como serpentes fascistas.

"Será que apenas os hermetismos pascoais
Os tons, os mil tons, seus sons e seus dons geniais
Nos salvam, nos salvarão dessas trevas...
E nada mais?"

Obra: SERPENTE, Victor Marie Hugo, 1866

quinta-feira, 21 de maio de 2020

TEMPO CINZA 7

Todos os dias ela acorda e no minuto seguinte um calafrio percorre seu corpo: lá fora, na rua, o perigo ronda todas as vidas.

Perigo dividido por dois: um minúsculo organismo, que nem célula tem, a que deram um nome de laboratório, Covid-19, parecendo com aqueles nomes que os astrônomos dão a galáxias distantes no espaço-tempo, como M-31, NGC-292...

E o outro perigo, que também ronda invisível pelas ruas e avenidas, e que é tão mortífero - ou mais - quanto o primeiro. O nome que o classifica hoje virou não só sinônimo, mas adjetivo: fascismo.

Ela às vezes não tem vontade de sair da cama...

Obra: ANNABEL DORMINDO, Lucien Freud, 1988

TEMPO CINZA 6

Ontem o menino de 14 anos João Pedro Mattos foi assassinado pela PM do Rio.

No mesmo dia em que morreram de uma só vez quase 1200 brasileiros.

No mesmo dia em que o maldito presidente faz piada.

Meu abraço distante e minha solidariedade à família de João Pedro Mattos.

Obra: MÃE COM O FILHO MORTO, Käthe Kollwitz, 1903

TEMPO CINZA 5

Uma morte a cada 73 segundos...
Uma morte a cada 73 segundos...
Uma morte a cada 73 segundos...
Uma morte a cada 73 segundos...
a cada 73 segundos...

Passamos dos mil mortos em 24 horas...

Obra: TRISTEZA, Paul Cézanne, 1867

TEMPO CINZA 4

Quando eu era criança, gostava das histórias que meu pai contava. Eram histórias do sertão, do povo do sertão, de um Brasil que ainda existe lá no fundão do Brasil. Uma delas, que nunca esqueci, foi a de um cachorro. Seu dono, parente de meu pai, havia morrido e sido enterrado num cemitério desses que nem muro têm, como a gente ainda vê no interior do país. Enterrado a sete palmos, com uma cruz de madeira e talvez alguma coroa de flores, naturais ou não. O cãozinho permaneceu vivendo na mesma casa, que também era sua, com os outros da família. Mas seu lado era junto do companheiro morto, e todas as noites e até o fim de sua pequena vida - disse meu pai - o cachorrinho seguia seu caminho até o cemitério e dormia a noite inteira sobre a cova de seu dono.

Então em homenagem aos animaizinhos que nesta pandemia estão ficando sós, vai esta pintura.

Obra: O LAMENTO DO CÃO PASTOR, Edwin Landseer, 1837

TEMPO CINZA 3

Hoje, domingo, amanhecemos oficialmente com mais de 15 mil mortos por Covid-19 no Brasil. Quinze mil mortos! Quinze mil vidas se foram em poucas semanas! Num país cujo presidente brinca com a morte, como um fascista!
Obra: NO LEITO DE MORTE, Edvard Munch, 1893


TEMPO CINZA 2

A pintura escolhida para hoje:
OS RETIRANTES, Candido Portinari, 1944
E com ela um pequeno trecho de outro grandemente triste retrato do povo brasileiro, de Vidas Secas, de Graciliano Ramos:
"Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. (...) Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros apareceu longe, através dos galhos pelados da caatinga rala. Arrastaram-se para lá, devagar (...)
Os infelizes brasileiros de sempre, historicamente os mesmos, que já vão nascendo "com cara de fome", estampados na arte de Portinari e Graciliano. E de Chico e de Caetano. Pobres, trabalhadores, favelados, pingentes, faxineiras, paus de arara, pedreiros, balconistas, boias-frias, índios e mulatos, malandros e bandidos, banidos quase todos, "quase todos pretos", aguardam cada qual seu momento de morte física, pois que há muito vivem como mortos para certa elite, certa classe média, certa gente escrota e vil.
Gente escrota e vil que elegeu um monstro, o Inominável genocida, assassino explícito, Ceifador maior de toda a nossa gente.

quarta-feira, 13 de maio de 2020

TEMPO, TEMPO, TEMPO CINZA

Nestes tempos terríveis de Covid-19, tenho estudado e lido muito sobre as Belas Artes. Hoje, lendo Fayga Ostrower, me veio a ideia que passo a por em prática aqui, retomando meu trabalho neste blog. Talvez inspire, talvez deprima. Porque não trago imagens de alegria, mas pinturas com temas de morte, doença, fome, desemprego… toda essa desgraça que nos atinge. Começo com Courbet, pintor francês, de quem compartilho a admiração com meu amigo Henri, de Paris.

Aqui Courbet retrata uma cerimônia fúnebre, sem nenhum tipo de floreio mitológico ou religioso. Não há anjos, nem figuras alegóricas. Nada! A morte mostrada com sua cara, nua e crua. Pessoas estáticas, em silêncio, de luto. Atrás delas um horizonte tão pesado quanto os sentimentos das pessoas. É uma pintura de uma tristeza imensa, como são as fotografias dos buracos abertos no cemitério da Vila Formosa em São Paulo ou de algum cemitério de Manaus. Junto ao féretro, acompanhando tudo, um cãozinho, como é comum acontecer de aparecer, em qualquer circunstância de uma pequena cidade como Ornans, que visitei com meu outro amigo Pierre Ringot no ano passado… “Enterro em Ornans” é a melancolia destes dias em que milhares de pessoas estão sendo enterradas solitariamente. Ninguém querido dando o adeus final. Pessoas que nunca se viram em vida, dividindo a mesma vala comum dos desgraçados... Além do coveiro talvez um pequeno cão vira-lata apareça para a despedida... ou nem mesmo um cão...

ENTERRO EM ORNANS, Gustave Courbet, 1849