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quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Bananas e poderes podres

Campo de batalha 3, óleo sobre tela, Antonio Amaral, 1973
A força das ideias gera a história, movimenta os povos, muda sistemas. Nas artes, inúmeros artistas não ignoraram o que aconteceu em seu próprio tempo, criando obras que foram testemunhos históricos e ao mesmo tempo marcos estéticos de suas épocas. No Brasil dos tempos da ditadura militar, um artista se destacou: Antonio Henrique Amaral. Antonio Henrique Abreu Amaral nasceu em São Paulo, capital, em 1935 e faleceu em 2015. Formou-se em Direito pela Universidade de São Paulo, mas seguiu a carreira artística. Sua formação se inicia em 1952 na Escola do Masp (Museu de Arte de São Paulo). Ele foi também aluno de gravura do artista Lívio Abramo que, em 1956, ensinava essa técnica no Museu de Arte Moderna de São Paulo, o MAM.
Antonio Amaral
Em 1958, Antonio Amaral viajou para Chile e Argentina, realizando diversas exposições. Nessas viagens, conheceu o poeta Pablo Neruda. No ano seguinte, além de expor em Washington, EUA, participou de oficinas com artistas norte-americanos em Nova York. Retorna ao Brasil em 1960 e passa uma temporada no Rio de Janeiro, onde entra em contato com Candido Portinari, Djanira e Oswaldo Goeldi, este também gravador. Voltou para São Paulo em 1961, onde passou a trabalhar como redator publicitário, mas sem abandonar sua atividade artística. Com o golpe militar de 1964, Antonio Henrique Amaral incorporou a seu trabalho uma temática mais incisiva, com críticas claras à falta de liberdade e à censura. Em 1967 lançou o livro de xilogravuras intitulado “O meu e o seu”, com apresentação do poeta Ferreira Gullar. Nesse album, ele sintetiza a questão do autoritarismo político dos militares no poder. Neste ano, inicia seu trabalho com a pintura. Em 1968, veio o AI5, radicalizando ainda mais a perseguição dos militares a artistas e intelectuais e a todos os opositores do regime. Começou a trabalhar numa série de pinturas intitulada “Bananas”, onde está muito clara a sua denúncia política contra a ditadura. Era uma referência também às ideias do Tropicalismo, mas também ao tema da antropofagia defendido pelos modernistas de 1922, como Oswald e Mário de Andrade.
"Sem saída",
xilogravura, 
Antonio Amaral, 1967
Em 1971 ganhou um prêmio no Salão de Arte Moderna do RJ, com uma viagem ao exterior. Foi novamente para Nova York e voltou ao Brasil em 1974. Nesses anos fora do Brasil, Antonio exibiu suas obras em exposições em diversos países. Sua série das “Bananas” mostra claramente sua crítica ao que estava acontecendo em nosso país. Um desses trabalhos apresenta uma banana cortada e envolta por um garfo, ambos amarrados por um grosso barbante. Como uma metáfora do regime militar, o artista expõe bananas apodrecidas, espetadas por garfos pesados, que parecem denunciar a tortura cruel aos presos políticos. A metáfora das bananas sempre foi usada em diversos momentos da nossa história, desde a pintura “Tropical” de Anita Malfatti (1889-1964), passando pela “A Negra” de Tarsila do Amaral (1886-1973), e até “Bananal” de Lasar Segall (1891-1957). Na década de 1930 o compositor Braguinha explicitou na letra da música “Yes nós temos bananas”, de forma gaiata, a exploração das riquezas do Brasil por parte dos estrangeiros. Na década de 1940 Carmen Miranda balançava suas curvas nos Estados Unidos, criando a imagem caricata da latino-americana com seu chapéu excêntrico carregado de bananas e outras frutas. Ou seja, Antonio Henrique voltava à mesma metáfora para mostrar que o país da banana e do carnaval sofria com a ditadura militar. Uma de suas pinturas mais explícitas é “A morte no sábado - homenagem a Vladimir Herzog”, na qual o artista denuncia o assassinato do jornalista da TV Cultura nos porões da ditadura dos generais brasileiros.

 "A morte no sábado - homenagem a Vladimir Herzog",óleo sobre tela, Antonio Amaral, 1975

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Uma artista em defesa da vida


Xilogravura de Käthe Kollwitz
Hoje, 10 de dezembro, a Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 70 anos de promulgação, pela ONU, em 1948. O mundo ainda estava abalado com os efeitos terríveis de duas grandes guerras mundiais. Muitos artistas - ao redor do mundo - expressaram em suas obras os efeitos destes abalos e como eles atingiram o mais básico direito de todos, o direito à vida.

Uma mulher, Käthe Kollwitz, desenhista, escultora e gravadora alemã, se destaca, pelo conjunto de sua obra, como a grande defensora dos direitos humanos mais fundamentais.

É uma experiência de contemplação profunda, observar seus desenhos, sua sensibilidade ao ser humano que sofre. Do início do século XX até à II guerra mundial, a Alemanha, onde vivia Käthe Kollwitz, era um país sombrio, que ela refletiu em seu trabalho: retratou crianças famintas, doentes, jovens mortos pela guerra, operários desempregados, pessoas na miséria… Na década de 1920, em especial, a situação econômica na Alemanha era muito ruim e o povo estava desempregado, faminto, doente... e com medo. O filme do diretor Ingman Bergman, "O Ovo da Serpente", dá um quadro bem real do que era viver em Berlim naquela época. Ao rever o filme, nos dias atuais, é possível encontrar preocupantes similaridades entre aquele período e os dias em que vivemos atualmente aqui no Brasil...

Käthe nasceu na pequena cidade de Königsberg, em 8 de julho de 1867. Antes dos 20 anos de idade, totalmente apoiada por seu pai, viajou à Berlim e Munique para estudar desenho. Tornou-se amiga dos escritores Gerhart Hauptmann e Arno Holz, com os quais ia ao museu de Munique admirar juntos as pinturas de Rubens. Logo em seguida, foi estudar em Berlim com um pintor especialista em retratos, Karl Stauffer-Bern, que lhe orientou a estudar gravura com Max Klinger.

Retornando à Köninberg, ela continua trabalhando em seu projeto iniciado em Munique, inspirado no romance “Germinal” de Émile Zola, o qual retrata a vida dos mineiros franceses. Ela vai fazer suas pesquisas de figuras humanas nos bares à beira-mar. Nesse período, aprende com o gravador Rudolf Mauer a técnica da litogravura (gravura em pedra).

Casou-se com Karl Kollwitz, que havia se formado em medicina, e foram morar em Berlim, no bairro Prenzlauer, onde ele abriu seu consultório. Estudando os  escritos teóricos de seu professor de gravura Max Klinger, Käthe se convence de que era necessário recorrer ao desenho para ser capaz de fornecer uma representação gráfica dos difíceis tempos em que ela vivia. 

Em 1892 nasce seu primeiro filho, Hans. No ano seguinte, após assistir a uma peça de teatro que descrevia a revolta dos tecelões da Silésia contra a fome em 1844, Käthe Kollwitz iniciou seu primeiro ciclo de gravuras "A Revolta dos Tecelões", trabalho que ela completou em 1897.

Em 1896 nasce seu segundo filho, Peter.

Ela expõe pela primeira vez em 1898, na Grande Exposição de Arte de Berlim, onde apresenta as gravuras com o tema da revolta dos tecelões. Foi muito elogiada e reconhecida como artista. O júri dessa exposição queria lhe conferir uma medalha, mas o imperador da época, Guilherme II, se opôs à ideia, pois o tema não lhe agradava, assim como não era usual prestar homenagens a uma mulher...   

Entre 1898-1903, Käthe deu aulas de desenho e litografia na Escola de Artistas de Berlim. Em 1899 participa da primeira exposição do grupo que ficou conhecido como "Secessão de Berlim", do qual foi membro de 1901 a 1913. Na exposição sobre arte alemã na cidade de Dresden, finalmente ela pode receber uma Medalha de Ouro por seu conjunto de gravuras sobre os tecelões.

Mais uma vez se inspirando em um livro (de Wilhelm Zimmermann, "História Geral da Grande Guerra dos Camponeses"), ela começa a preparar suas gravuras com o tema "Guerra Camponesa".

Durante uma viagem de dois meses a Paris, Käthe fez aulas na Academia Juliana para se familiarizar com os conhecimentos básicos de escultura, forma de arte pela qual seu interesse era crescente. Participou, então, de oficinas de escultura no ateliê de Auguste Rodin.

Em 1906, Käthe desenhou o cartaz para a exposição "Trabalho doméstico na Alemanha" em Berlim, e mais uma vez desagradou aos poderosos de seu país: a Imperatriz se recusou a ir visitar a exposição enquanto o cartaz de Käthe não fosse recolhido da rua.

Em 1907, participando de uma exposição dirigida por Max Klinger na Itália, ela pode conhecer Florença, onde ficou por vários meses, e Roma, onde passou três semanas.

Entre 1908 e 1910, a artista colaborou com o jornal satírico “Simplicissimus” com 14 desenhos onde ela expunha os problemas atuais do proletariado. Sua arte gradualmente passa a mostrar como ela se comprometia, social e politicamente, com os rumos de seu país.

A partir de 1909 ela passa também a se dedicar ao trabalho com escultura. Em 1912, é escolhida como a chefe do grupo de artistas "Secessão de Berlim".

Seu cartaz, desenhado para o Sindicato das Comunas da Grande Berlim, que denunciava a grande escassez de moradias na cidade, foi censurado e proibido de ser exibido.

Em 1913, por disputas internas, a "Secessão de Berlim" se divide, e Käthe adere ao grupo "Secessão Livre", que presidirá de 1914 a 1916. Ela será co-fundadora e primeira presidente da Associação de Arte da Mulher, até 1923.

O ano de 1914 foi terrível para ela. Seu segundo filho, Peter, que havia se voluntariado na frente de guerra na Bélgica, morre em combate. Tinha 18 anos.

Imediatamente sua mãe resolve entrar no movimento pacifista, contra a Guerra. Ela começa a pensar em como transformar essa dor da perda do filho em um monumento, que somente ficará pronto em 1932 e se denomina "Mãe em luto".

Em uma carta datada de 30 de outubro de 1918, publicada em um jornal de Berlim, ela se opõe ao movimento “Apelo em favor da guerra”, que estava sendo organizado na cidade. Ela termina a carta citando uma frase do livro de Goethe “Os anos de aprendizagem de Wilhelm Meister”: “as sementes não podem ser moídas”. E passa a trabalhar em uma série de xilogravuras intitulada “Guerra”. 

Em 1919, Käthe Kollwitz torna-se a primeira mulher a ser aceita como membro da Academia de Belas Artes da Prússia, para onde foi nomeada professora, função que não chegou a exercer porque mulheres não podiam ocupar cargos públicos...

Sua dor pessoal - a morte do filho -, refletia-se cada vez mais em seu trabalho, tornando-o ainda mais dramático, onde ela expunha suas próprias feridas e as de todos os que sofrem com a guerra.

Neste sentido, faço um destaque sobre o conjunto da obra de Käthe Kollwitz: ela dá um grande papel - tanto em suas gravuras, quanto em seus desenhos e esculturas - à imagem da mulher, especialmente a da mãe. A mãe como detentora potencial da vida, aquela que supre e nutre, a que cura e protege. Em várias de suas gravuras há uma mãe, ou grupos de mães unidas protegendo os corpos de seus filhos com seus próprios corpos. Com toda sua energia. Parece querer mostrar, através da imagem simbólica da mãe, que a sociedade deveria ser a mãe que dá a vida, e não a morte; que agrega, e não divide; que envolve, ao invés de desprezar; que protege, ao invés de abandonar. 

Também como uma mulher que vive em uma época tão dura, Käthe Kollwitz fez vários autorretratos, como se tentasse acompanhar nos traços do seu rosto que ia envelhecendo, toda a sua própria experiência, seu sofrimento, seu choque diante de um mundo onde os direitos eram tão vilipendiados que deixavam marcas em sua própria face.

Em 2010, visitei o Museu Käthe Kollwitz, em Berlim, na mesma casa onde ela viveu com sua família. Sua obra já me impressionava desde meus 20 anos. Pude ver de perto como ela escancara as zonas sombrias da vida, com uma força intensa nos traços, uma força pulsante e latente de uma artista e mulher que não se rende, não se acomoda. Artista inquieta, forte, determinada, consciente de seu papel no mundo. Tudo isso representado em sua arte.

Mas um trabalho seu me impressionou ainda mais: o monumento que foi inaugurado em 1932, intitulado “Mãe em luto”, localizado num prédio quadrado, com  fachada em estilo clássico, localizado na avenida principal da cidade, a Unter den Linden. Um imenso monumento fechado, como uma caixa, escuro. No centro, a escultura mostrando uma mãe com o corpo do filho morto. No alto, acima dela, a única entrada de luz é através de uma claraboia que se derrama furtivamente sobre a escultura. Em volta do imenso salão, ladeando as paredes, um balcão de concreto onde os visitantes podem se sentar e observar. Eu fiquei sozinha por um bom tempo, contemplando esse conjunto inquietante, o lugar em penumbra, a escultura solitária de uma verdadeira “mater dolorosa”, uma espécie de releitura da “Pietá” de Michelangelo. A Mãe é maior que o Filho, um homem adulto: que precisava ser maior, para poder representar a vida que ela gostaria de dar de volta a seu filho, localizado entre suas pernas abertas, como se ela o empurrasse de volta para seu ventre, para fazê-lo renascer. Mas ele está morto, e a mãe também o vela, o abraça, o aconchega. Parece cantar para ele alguma canção longínqua de ninar... Esta escultura é a dor de todas as mães do mundo, as mães que perderam seus filhos. É o retrato também da mãe negra, brasileira, carregando seu filho morto pela violência policial, cena que se repete a cada 23 minutos em nosso país!

Käthe Kollwitz produziu muito em toda sua vida, sempre com foco nos oprimidos, nos famintos, nos injustiçados. Lutou pela paz, desenhando cartazes e fazendo ilustrações. Sofreu censura do governo nazista também, como havia sofrido dos imperadores. Se impôs como artista e foi ativa na luta por mais direitos para as mulheres. 

Chegada a II Guerra, Käthe se refugiou, já viúva, no povoado de Moritzburg, próximo a Dresden. Morre a mulher, no dia 22 de abril de 1945, com 77 anos de idade, mas a obra dessa artista gigante permanecerá viva por muito tempo, pois sua obra defende aquele direito fundamental do ser humano, a Vida.

Xilogravura de Käthe Kollwitz
Litogravura de Käthe Kollwitz

Técnica: água-tinta e ponta-seca de Käthe Kollwitz

Técnica: Água-tinta de Käthe Kollwitz

Litogravura de Käthe Kollwitz

Xilogravura de Käthe Kollwitz

sábado, 2 de agosto de 2014

Ateliê Contraponto homenageia Vera França

Neste último dia 30 de julho, o Ateliê Contraponto mais uma vez abriu suas portas para receber dezenas de pessoas, entre artistas e amantes da arte. Nesse evento intitulado "Vera França Modelo Vivo", nós homenageamos dona Vera França, uma senhora de 73 anos de idade, que há mais de 50 anos posa como modelo em ateliês de artistas, escolas, academias e espaços onde se pratica desenho, pintura, gravura, escultura.


Quarenta e seis artistas participam desta Exposição Coletiva em homenagem a dona Vera, com trabalhos que vão desde desenhos rápidos a mais trabalhados (com grafite, nanquin, carvão, pastel) até pinturas e esculturas. O ateliê do escultor Newton Santana participou com 9 esculturas, das 15 que estão lá.

Vieram artistas de outras cidades do interior de São Paulo, como Franca e Ribeirão Preto, assim como de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Muito conhecida em meio aos que praticam arte, especialmente em São Paulo, Vera França recebeu essa homenagem merecida de todas as cerca de 150 pessoas que estiveram no evento do dia 30. Ela estava muito feliz, pois sempre diz que se sente em casa em meio a pintores, escultores, desenhistas.

E o Ateliê Contraponto mais uma vez cumpre seu papel, que é ser um ponto de atração da arte em São Paulo. Reunindo artistas e ateliês, ajudamos a ampliar esta rede de pessoas que muitas vezes sozinhas em seus ateliês, ou residências, praticam sua arte. Sabemos o quanto é importante, em nosso meio, os contatos, as conversas, as exposições coletivas, os esforços conjuntos, a rede de amigos. Isso amplifica nossos esforços individuais, abre novas perspectivas. 

Por outro lado, fazemos uma justa homenagem a uma pessoa tão importante como "trabalhadora da arte" como Vera França! Afinal, a partir das poses dela muitos artistas puderam alcançar momentos sublimes em sua prática artística, ou mesmo momentos de aperfeiçoamento mais profundo no desenho, na pintura, na gravura, na escultura... Homenageando Vera, também homenageamos todos aqueles que trabalham como modelos vivos, que são muitos nestes tempos atuais. Quando dona Vera começou, São Paulo tinha menos de meia dúzia de pessoas que faziam esse trabalho...

O papel da arte também é este: juntar as pessoas, inspirar, reunir, enriquecer a vida com o potencial que a Arte abre à fruição do Belo, ao encantamento, à sensibilidade e à possibilidade de acesso à alma do mundo.

Parabéns, Vera França!

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Abaixo alguns momentos da inauguração da exposição:




















segunda-feira, 30 de junho de 2014

Anders Zorn, o pintor realista sueco



Autorretrato
Anders Leonard Zorn é um pintor de origem sueca, nascido em 18 de fevereiro de 1860. 
Sua pintura a óleo e suas aquarelas são compostas de paisagens sobre a vida no campo, de retratos e nus, e também mostram sua forma especial de representar a água. Ele é, junto com Carl Larsson, o pintor mais popular da Suécia.

Anders Zorn passou sua infância numa fazenda perto da cidade de Mora. Sua família tinha uma vida simples no campo, e isto marcou sua vida e sua obra, como mostram as numerosas obras que descrevem a vida camponesa na Suécia. Ele também fez vários quadros de sua mãe e de sua avó, a quem era muito apegado. Seu pai, Leonhard Zorn, um cervejeiro alemão, conheceu sua mãe durante uma viagem dele à Uppsala. Ela engravidou, mas Anders Zorn jamais viu seu pai. Foi criado pela mãe e avós maternos.

Em 1872, quando seu pai morreu, ele herdou uma pensão em dinheiro que lhe permitiu ir estudar na Academia Real de Belas Artes de Estocolmo. Inicialmente ele aprendeu a técnica da escultura em madeira. Imediatamente ele se interessou pela aquarela e muito cedo ele se tornou um prodígio de aquarelista em meio aos que frequentavam a academia. A sua tela “De luto” foi selecionada, entre outras, para a apresentação anual da Academia.
De luto, Anders Zorn, aquarela, 1880

Insatisfeito com o conservadorismo da Academia de Belas Artes, Anders Zorn a abandona em 1885 e sai em viagem pela Espanha, Paris e Londres. Nesses lugares, ele realiza diversos retratos em aquarela, nas quais chama a atenção para seu domínio técnico.

Casa-se em 1885, na Suécia, com Emma Lamm e viajam juntos para Constantinopla e Alger. Ele sempre observa a água dos mares por onde passava. Depois eles retornam à Suécia, e Zorn constroi uma casa na cidade de Mora, onde nasceu. 

Em 1889, ele foi a Paris participar da Exposição Universal daquele ano, mesmo período em que o Impressionismo começa a ser reconhecido como uma grande forma de pintura. Sua obra passa a ser bastante apreciada na França, para onde ele volta regularmente. Em 1906 ele expõe em Paris 166 quadros, e teve uma grande aceitação por parte de críticos e do público.

Nos últimos anos de sua vida, ele se dedica novamente à escultura e à gravura. Anders Zorn faleceu em Estocolmo, no dia 22 de agosto de 1920.

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Algumas de suas pinturas:






Gravura de Anders Zorn




quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Desenhos e gravuras do Renascimento alemão

Rinoceronte, Albrecht Dürer, 1515, Xilogravura, 24,8 cm × 31,7 cm

O Museu de Arte de São Paulo está apresentando, desde o dia 19 de outubro, uma exposição com 61 obras-primas da gravura do Renascimento alemão. Essas obras fazem parte da coleção de 100 mil obras doadas ao Museu do Louvre em 1935, pela família do barão Edmond de Rothschild. A mostra fica até 13 de janeiro no 2º andar do MASP.

O Renascimento alemão teve uma produção muito rica, uma das mais relevantes da arte europeia, mas “nem sempre reverenciada em grandes mostras”, diz o texto de apresentação da exposição do Masp.

Lucas Cranach, o velho,
Retrato de um jovem aristocrata,
acervo do Masp
Mas duas obras que pertencem ao acervo do Museu também foram integrados à mostra: as pinturas de Hans Holbein “O Poeta Henry Howard, Conde de Surrey” (1542) e, de Lucas Cranach, o “Retrato de Jovem Aristocrata” (1539).

O texto do portal do Masp também diz que, para o Diretor-Presidente do Louvre, Henri Loyrette, “essa célebre coleção reúne peças únicas, sem as quais nosso conhecimento da gravura alemã continuaria incompleto”.  O barão de Rothschild era um colecionador de obras de arte. Rapidamente absorveu o espírito do Renascimento e “reuniu as mais belas peças da gravura alemã dos séculos XV e XVI que a curiosidade intelectual, o estudo erudito e, algumas vezes, a sorte ofereceram para seu excepcional gosto pelo Belo”, completa Loyrette.

O Renascimento foi um movimento artístico e intelectual dos séculos XV e XVI, numa fase em que o capitalismo mercantilista se expandia pelo mundo e as cidades cresciam. Os valores da Idade Média iam sendo abandonados em favor de um maior foco no humanismo, que fez com que muitos artistas deixasse de pintar ao gosto da Igreja para se tornarem mais independentes, usando como tema ou a mitologia greco-romana ou cenas do cotidiano, pessoas comuns, a natureza.

A Itália, considerada o berço do Renascimento, tinha uma economia próspera e era uma região de muita efervescência cultural. Muitos mecenas patrocinavam a arte e para lá migraram muitos artistas, de diversas partes da Europa, para ter contato com a arte italiana e aprender com seus mestres.

Albrecht Dürer aos 13 anos,
autorretrato com ponta de prata
Um desses grandes artistas que se dirigu para a Itália foi Albrecht Dürer, que nasceu em Nuremberg em 1471. Dürer representava muito bem o espírito do Renascimento, pois ele era, além de pintor, gravador, ilustrador, desenhista, matemático e teórico da arte alemã. Mas seus interesses também abrangiam a Arquitetura, a Geografia e a Geometria. Ele influenciou muitos artistas do século XVI tanto na Alemanha quanto nos Países Baixos. Era um trabalhador árduo na sua arte e se especializou também nas artes gráficas, fazendo muitas xilogravuras, consideradas inovadoras. Ele também foi um dos primeiros mestres da aquarela, especialmente representando paisagens.

Foi nomeado pintor da corte pelo imperador Maximiliano I, em 1512. Dürer viajou também pelas Países Baixos, além da Itália, conhecendo muitos pintores e pessoas ligadas às letras. Em seus últimos anos de vida, em Nuremberg, fez diversos estudos sobre medida e proporção da figura humana, assim como perspectiva e geometria.

Santo Estáquio, de Albrecht Dürer
Teixeira Coelho, curador do MASP, diz que Dürer “foi o maior nome da gravura em todos os tempos até a chegada de Rembrandt, e foi a gravura que firmou seu nome internacional ainda em sua própria época. [...]Dürer, porém, não se limitou a levar a Renascença para o Norte (da Europa): de igual modo, trouxe o germanismo para o Sul, sobretudo com sua contribuição em favor da melhor reputação da gravura. Seu grande aporte, por arbitrário que seja destacar um dentre vários, foi a originalidade da invenção, algo que se poderá verificar nesta exposição, de modo central embora não exclusivo, nas peças Santo Eustáquio, A trindade e o popular Rinoceronte, três de suas muitas obras-primas”.

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Serviço:

Desenhos e gravuras do Renascimento Alemão na
Coleção Barão Edmond Rothschild - Museu do Louvre
De 19 de outubro de 2012 a 13 de janeiro de 2013
MASP - Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand
Av. Paulista, 1578
Horários: De 3ªs a domingos e feriados, das 10h às 18h. Às 5ªs: das 10h às 20h.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Kathe Kollwitz, uma artista em Berlim


Kathe Kollwitz, desenhista e gravadora alemã, é uma das mulheres mais importantes da historia alemã do final do século XIX até meados do século XX. A envergadura do seu trabalho faz com que ela seja conhecida e respeitada também fora do seu país, não somente por sua qualidade técnica, com traços de realismo e expressionismo, mas também como artista com preocupação humanitária, retratando os operários desempregados, a fome, a guerra e a pobreza, males do capitalismo.

Conhecendo um pouco de sua história. Kathe nasceu na pequena cidade de Konigsberg, na época pertencente à antiga Prússia, entre Stutgart e Leipzig, em 8 de julho de 1867. Antes dos 20 anos de idade, ela foi estudar desenho em Berlim e Munique. Casa-se, logo em seguida, com o médico Karl Kollwitz, com quem vai morar em Berlim, no bairro Prenzlauer. Em 1892 e 96 nascem, respectivamente, seus dois filhos, Jean e Pierre, o segundo morto no começo da I Guerra Mundial.
Em plena atividade como artista, ela expõe pela primeira vez em 1898 na "Grande Exposição Berlinense de Arte Contemporânea". Em seguida, começa a dar aulas de desenho na Escola de Arte Feminina de Berlim. De 1902 a 1908, Kathe Kollwitz trabalha em uma série de gravuras em água-forte, com o tema "A guerra dos camponeses". Em 1904, ela e seu marido vão morar em Paris por três anos, onde ela aprende as bases das artes plásticas na Academia Julian, além de frequentar o atelier do escultor Auguste Rodin. Após a temporada em Paris, o casal passa o próximo ano em Florença, na Itália, fazendo com que ela também tomasse contato com a arte italiana.
Em 1914, seu filho Pierre é morto na guerra que começava. A morte do filho refletiu-se em seu trabalho, tornando-o ainda mais dramático, fazendo com que a artista expusesse ainda mais suas próprias feridas e as de todos os que sofrem com a guerra, em seus desenhos. A morte, a perda maior, é um dos temas recorrentes em seu trabalho. Ela viveu o trágico período entre o começo do século XX e a II Guerra mundial, onde a morte rondava a todos, especialmente os alemães. Em 1919, Kathe Kollwitz foi nomeada professora da Academia de Belas Artes de Berlim, mas não chegou a dar aulas. Por ser mulher, simplesmente, uma vez que o governo daquela época não aceitava mulheres ocupando cargos públicos.
De 1920 a 1925 ela produz a serie de gravuras com os temas "Guerra" e "Proletariado", além de produzir numerosos cartazes de propaganda da luta dos trabalhadores e do povo pela paz. Em 1927, viaja a Moscou, onde recebe uma atenção especial do governo soviético e dos artistas plásticos russos.
De volta a Berlim, em 1928, ela dirige um atelier de artes gráficas na Academia de Belas Artes. Em 1933, é obrigada a deixar a Academia, por suas posições políticas ao lado dos operários alemães. Em 1936, sai uma interdição oficial, por parte do governo do partido nazista, para ela expor. Durante o período da segunda guerra mundial, entre 1943-44, ela se refugia, já viúva, no povoado de Moritzburg, próximo a Dresden e morre no dia 22 de abril de 1945, com 77 anos de idade.
Estive, semana passada, no Museu Kathe Kollwitz, aqui em Berlim. Funciona numa antiga casa de quatro andares, todos repletos de seu trabalho: desenhos, gravuras, esculturas. Foi uma das experiências de visitas a museus mais marcantes da minha vida. Conheço o trabalho de Kathe Kollwitz desde 1979 quando, ilustradora do movimento estudantil no Maranhão, me deparei com uma gravura dessa artista, da qual jamais esqueci, porque refiz o desenho dela em estêncil para o jornalzinho do DCE-UFMA, impresso em miméografo. Agora o original estava ali, na minha frente!
É uma experiência de contemplação profunda, observar seus traços, seu desenho, seus temas, sua sensibilidade ao ser humano que sofre. Ela era a artista dos mais pobres, dos famintos, dos renegados socialmente. No período do século XX que vai até a II guerra mundial, a Alemanha, onde vivia Kathe Kollwitz, era um país sombrio, o que se refletiu profundamente em seu trabalho. Na década de 1920, apos a I Guerra, os alemães estavam desempregados, famintos, doentes, e com medo. O filme do diretor Ingman Bergman, "O Ovo da Serpente", dá um quadro bem real do que era viver em Berlim naquela época. Vale a pena assisti-lo para compreender melhor como aqueles tempos angustiantes.
Mas uma característica especial salta aos olhos ao observar o trabalho de Kathe Kollwitz: grande parte de suas gravuras usa a imagem da mulher, especialmente da mãe. A mãe, como detentora potencial da vida, aquela que supre e nutre, a que cura e protege. Em várias de suas gravuras há uma mãe, ou grupos de mães unidas, protegendo os corpos de seus filhos com seus próprios corpos. E toda sua energia. Parecia que a artista queria mostrar, através da imagem simbólica da mãe, que a sociedade deveria ser a mãe que agrega, ao invés de dividir; que envolve, ao invés de desprezar; que protege, ao invés de abandonar. Essa sociedade, basta uma olhada rápida para qualquer rua hoje, não é dentro do sistema capitalista.
Talvez por ter perdido seu próprio filho na guerra, haja tantas mães em seus desenhos, defendendo seus filhos da morte. E talvez por ser uma mulher vivendo em uma época dura, ela tantas vezes sentiu necessidade de se auto-retratar, como se tentasse encontrar nos traços do seu rosto algum delineamento coerente. Ou pode ser que tentasse se rever como mulher, diante do próprio espelho, com rosto atualizado, vendo o processo do envelhecimento deixar marcas em sua face.
Mas... por trás dessa aparente tristeza presente em sua obra que escancara as zonas sombrias da vida, existe uma força nos traços, uma força pulsante e latente, a força da vida, da mulher que não se rende, da mãe que não se acomoda, da artista inquieta. Seu trabalho mostra, acima de tudo, a energia da vida, a fortaleza, a determinação e a consciência que inspiram aqueles que se engajam na luta por um mundo mais humano. Tudo isso mostrado dentro de um trabalho que apresenta gravuras, esculturas e desenhos que falam por si só, de tão imensa e tecnicamente belos!