quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Em nome dos outros artistas

Enquanto certa elite local festeja a presença em terras paulistanas dos cadáveres de Damien Hirst ou se excita diante das fotopornôs de Jeff Koons e sua Cicciolina libidinosa (além de outros objetos que o crítico francês Jean Clair chama de “lixo”), o Metropolitan Museum of Art de New York apresenta outro tipo de obra de arte e de artista. A elite a que me refiro é esta, a tupiniquim, que acaba de dizer que São Paulo chegou ao “primeiro mundo” (nada mais fora de moda…) porque trouxe nomes do mercado da arte dos Estados Unidos (exceto Hirst, que é inglês) para comemorar os 60 anos da Fundação Bienal de São Paulo…


Mas vamos ao artistas que interessam…


O  Museu norte-americano foi para o outro lado e, ao invés de mostrar lixo como arte (mesmo que reconheçamos que se trata de um lixo muito caro, como os cadáveres de Hirst), resolveram abrir as portas do Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque para apresentar diversas exposições com artistas do nível do holandês Franz Hals, por exemplo, além de desenhos chineses da dinastia Ming, de pinturas hindus e de caricaturas feitas por desenhistas que vem desde Leonardo da Vinci ao caricaturista norte-americano David Levine.


Autoretrato, Franz Hals

Franz Hals

Este artista nasceu entre 1580 e 1583, nos países baixos, região onde hoje fica a Holanda. Teve dois filhos com a primeira esposa, que faleceu em 1616, e mais oito filhos com a segunda. Destes filhos todos, cinco seguiram a carreira do pai e também se tornaram pintores. Após a Queda de Anvers, sua cidade natal, tomada pelas tropas espanholas, se refugiou em Haarlem, onde viveu o resto da vida.


Por volta de 1600 começou sua aprendizagem na pintura, no atelier de um outro flamengo que emigrou, Carel Van Mander, um pintor maneirista. Mas desde seus primeiros quadros, Hals mostra semelhança com os pintores caravagescos de Utrecht (influenciados pelo italiano Caravaggio). O estilo de Franz Hals influenciou de uma forma marcante, mais de dois séculos depois, o pintor realista Gustave Courbet e também os impressionistas como Van Gogh, Monet e Manet.



Petrus Scriverius, 1626
Hals é mais conhecido por seus retratos da burguesia e dos cidadãos ricos da época, mas também retratou diversas pessoas de origem social diferente: militares, comerciantes, advogados, funcionários públicos, músicos, cantores de rua, pescadores… Seus rostos – como fazia Caravaggio – não eram idealizados, mas mostravam as expressões faciais de cada um. Pintor barroco, ele pintou com um realismo intimista e radicalmente livre.


Contemporâneo de outro pintor holandês também barroco e também com viés realista, Rembrandt, Franz Hals se distinguia dele pelos efeitos de luz e sombra em suas telas. Mas os dois são especialistas em pequenos toques com tinta na tela, que são suficientes para produzir efeitos de luz e de sombra, sem cair no detalhismo dos pintores mais voltados para a pintura linear.



Paisagem chinesa
A Arte do desenho no século XVII chinês

O período abordado por esta exposição vai de 1368 a 1644, quando houve o colapso da dinastia Ming e a conseqüente conquista da China por tribos nômades. Este foi um dos períodos mais traumáticos da história chinesa, mas permitiu surgir uma onda de artistas que se destacaram nessa época. Na exposição estão presentes mias de 60 pinturas de paisagens e caligrafias que demonstram um estilo bem pessoal dos artistas dessa época, como Huang Daozhou, Hongren, Shanren Bada (Zhu Da), e Shitao. Suas pinturas demonstram as condições emocionais em que viviam os artistas sob o poder invasor, suportando condições muito severas de vida, pressões psicológicas de toda ordem (pois eles se mantinham fieis aos seus antigos governantes) e muitos deles buscaram refúgio em meio à natureza, que retrataram com paisagens muitas vezes duras, densas. Mas esses artistas usaram a pintura e a caligrafia como forma de se expressarem, com isso desenvolvendo uma técnica e um estilo que influenciam a pintura chinesa até os dias de hoje.



Gushtasp mata o dragão: Página de um manuscrito Shahnama Mestre do Shahnama Jainesque
Pintores mestres da Índia

Abrangendo o período que vai de 1100 a 1900, portanto oitocentos anos da pintura hindu, que tem sido classificada de acordo com os diversos estilos regionais, e também dinásticos, com ênfase no tema e conteúdo narrativo. São 220 trabalhos selecionados a partir dos 40 maiores pintores indianos, alguns dos quais estão sendo identificados pela primeira vez.






Caricatura e sátira de Leonardo a Levine


Desenho de Leonardo da Vinci
A exposição explora o desenho como caricatura e sátira em suas diversas formas a partir do Renascimento italiano até o presente, elaborado principalmente a partir do rico acervo desse material no Departamento de Desenhos e Gravuras do Museu, que contém  – entre tantos – desenhos, por exemplo, do italiano Giovanni Paolo Panini (1691-1765).


Inclui desenhos e gravuras de Leonardo da Vinci, do francês Eugene Delacroix, do espanhol Francisco Goya, do também francês Henri Toulouse-Lautrec, assim como obras de artistas mais frequentemente voltados ao humor, como James Gillray, Thomas Rowlandson, Honoré Daumier, Al Hirschfeld e o norte-americano David Levine. Muitas destas caricaturas nunca foram exibidas antes, sendo, por isso, pouco conhecidas do público.


Quer dizer... dentro da lógica da elitezinha local, o "primeiro mundo" está escolhendo mesmo é ver Arte.



Caricatura sobre a guerra portuguesa, 1831-1834, de Honoré Daumier

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

30 mil acessos completados!

30 MIL ACESSOS EM 1 ANO E 5 MESES!


Este blog fala de Arte há pouco mais de um ano, mais precisamente desde abril de 2010. São 17 meses de vida de um espaço onde o assunto é um só: Artes Plásticas.


Temos tido uma boa repercussão do que aqui se publica: comentários que são postados, e-mails que são enviados, incentivos de amigos, sites de parceiros que nos procuram propondo parcerias... além de saber que os textos deste blog têm servido para auxiliar estudantes e professores em seus trabalhos sobre o tema da Arte. Textos livres, diga-se de passagem... Quem quiser copiar que copie, porque estas ideias devem ser mesmo espalhadas o máximo possível. Este blog também me rendeu um convite: escrever um livro para professores de Arte do ensino médio, que sirva como um guia para suas aulas. A ideia está sendo gestada...


Os acessos têm vindo de todos os cantos do mundo: Brasil, Portugal e Estados Unidos estão na frente entre os que acessam diariamente este blog. Fora eles, França, Alemanha, Argentina, Reino Unido, Itália, Espanha e até leitores de terras longínquas como os Emirados Árabes, a China e a Rússia têm passado por aqui! A facilidade de tradução online tem ajudado estas ideias escritas em minha língua-mãe a serem lidas por qualquer pessoa de qualquer outra língua, criando uma grande rede em torno da Arte.


Isso nos incentiva a continuar utilizando este Blog para divulgar não só meus estudos pessoais (desenhos e pinturas), mas principalmente minhas ideias sobre Arte. Tenho uma visão crítica sobre a arte que se produz nos dias de hoje; tenho uma visão crítica sobre o mundo de hoje; e uma coisa está diretamente vinculada à outra. Eu defendo explicitamente a pintura figurativa, em especial a Arte Realista, que é a que eu pratico; e não só eu, mas dezenas de pessoas que frequentam o Atelier de Maurício Takiguthi, aqui em São Paulo. Além de outros pelo Brasil e pelo mundo. Nisto eu não estou só!

Seguimos de perto mestres do passado, como Caravaggio, Rembrandt, Vermeer, Ticiano, Rubens, Velazquez, José Ribera, Gustave Courbet, Delacroix, entre outros, mas também acompanhamos com atenção os contemporâneos como Antonio Lopez, Lucien Freud (recentemente falecido) e os realistas norte-americanos, como Burton Silverman e David Leffel, além de outros.

Por tudo isso a orientação é: vamos continuar! E que venham os próximos 30 mil acessos! Bem vindos todos e obrigada a todos os que passeiam por estas páginas!


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Para comemorar aqui vão alguns estudos com pastel em tons de cinza:







sexta-feira, 23 de setembro de 2011

“Quando o tempo for propício” *

Há um costume entre as pessoas mais velhas de qualquer período histórico: um olhar para seu passado com certa melancolia, contaminada pelo sentimento de que “naquele tempo, sim, as coisas andavam melhores no mundo”...
Mas vamos e venhamos, vivemos num momento histórico privilegiado, por tantos desafios lançados às mentes humanas nestes tempos nebulosos. Há que se estar atento a cada movimento, quando nos encontramos em meio ao nevoeiro: um pode nos salvar; outro pode ser o fim. E as sereias cantam docemente, enganando até mesmo velhos marinheiros.
Tempo rico, tempo são. Tempo louco.
O mundo anda mal. Crise econômica generalizada atingindo principalmente os países ricos, como os EUA, onde hoje mais de 46 milhões de pessoas vivem na margem da pobreza. Em Nova Iorque de cada cinco, uma pessoa está nessa situação! Fora os cerca de um bilhão de seres humanos no planeta que ainda passam fome em pleno século XXI!
O mundo anda mal também nos aspectos, digamos, mais subjetivos. De uma subjetividade estranha, porque, de tão pesada, atinge a todos nós em pleno fígado. Todos nós??? De quem se trata esse “nós”? “Ele inclui bispos e gerentes de banco?” pergunta Terry Eagleton em seu livro As ilusões do pós-modernismo. Não, porque neste mundo de seres iguais uns são “mais iguais” do que os outros. Esses “mais iguais” são os promotores desse festival de estupidezes a que assistimos, que nós podemos intitular de “o mais novo pensamento dos novos capitalistas neoliberais e pós-modernos”:
- foi decretado que o sonho humano que animava milhões de pessoas pelo mundo não é mais possível: o Socialismo acabou;
Auto-retrato, de Egon Schiele
- foi instaurado o reino do individualismo e agora é o salve-se quem puder, cada um por si, deus contra todos;
- foi instalado o reino do Instantâneo, do Superficial, do Efêmero – contemporâneo do macarrão que se cozinha em 3 minutos e se come em um;
- foi decretada que a Quantidade (de dinheiro, de prazer, de consumo, etc) se sobrepõe à qualidade;
- está deliberado que a Aparência é um valor em si mesmo e que a Visualidade reina sobre qualquer conteúdo. Com isso procure-se qualquer clínica de estética e se re-estetize a você mesmo;
- foi decidido que a Globalização tem predominância sobre as regionalidades e as nacionalidades;
- foi deliberado que o indivíduo narcísico tem mais valor do que qualquer grupo ou coletividade; que do alto do seu posto, o Eu individual NADA PODE fazer para mudar o mundo e reinventar outra ordem social, porque “a história acabou”;
- foi decretado que a mídia é o grande porta voz dos discursos desconstrutores e reconstrutores do mundo, em afinidade com as ideias pós-modernas;
- está deliberado que a Arte Contemporânea continuará sendo a repetição de fórmulas que já duram cem anos, mas que são congruentes com esse espírito que de tão moderno chega a ser pós-moderno, em seus discursos sem sentido.
Porque está decretado que nenhum discurso mais precisa ter sentido, a linguagem está livre para-o-que-der-e-vier e qualquer um pode dizer o que quiser, na língua que desejar, porque TUDO o que importa é a expressão de qualquer discurso.
E também decretou-se que a Arte morreu. Depois re-decretou-se que tudo é arte, incluindo as secreções do corpo humano... Depois decreta-se que arte é discurso e que basta uma boa ideia e um bom curador para que qualquer coisa alcance o status de arte. Mas tem um detalhe importante: quem decide o que é Arte hoje é uma entidade denominada Mercado, porque tudo o que o homem produz nos dias de hoje só tem existência se se transformar na simbologia capitalista que produza mais-valia.
Os mais velhos podem ter alguma razão. Até há poucas décadas atrás (duas, no máximo) o mundo era mais simples: havia o sonho socialista, de um lado, e os que reagiam contra a ideia de que o capitalismo não era o melhor dos mundos: os reacionários.
Mas o capitalismo não é o melhor dos mundos: basta olhar para as ruas ocupadas por multidões sem rumo, engarrafadas, se movimentando em seus automóveis em direção... ao que mesmo? Depende. Pode ser até o shopping center ali da esquina!
Moça gorda, de Lucien Freud
Mas para “re-significar” (eles adoram essas expressões) o pobre coitado que está ali na luta pela sobrevivência, basta algumas horas de reconstrução da sua figura, enfumaçada pelo status quo


- disponibilize-se salas de musculação; cirurgia plástica; lipoaspiração; rejuvenescimento; massagem; maquiagem definitiva; alisamento permanente; botox; alongamento de pênis; depilação masculina e feminina; vitaminas a, b, c do alfabeto inteiro disponíveis; cirurgias de redução do estômago crescido de quem comeu todas as calorias estimuladas pelas indústrias fornecedoras dos supermercados; drogas para dormir, ter tesão, turbinar o cérebro; revistas que dariam inveja ao famoso Jack, estripador: pernas, braços, barrigas-tanquinho, rostos esticados; bundas, coxas de gostosas e gostosos, cabelos loiros e pretos alisados, mais loiros do que pretos; toda a farmacologia disponível e pesquisada pela imensa indústria farmacêutica que promete o aumento da expectativa de vida... ufa! Para viver dez anos a mais nesse inferno?
Distante da ideia do coletivo, o indivíduo lançado ao seu mundinho umbilical pensa que, finalmente, no reino do “eu” ele vive no melhor dos mundos: pois “O Diabo o levou a um lugar alto e mostrou-lhe num relance todos os reinos do mundo. E lhe disse: Eu te darei tudo isto e tudo será teu, se prostrado me adorares!” Diz o espírito do mundo capitalista a quem quiser ouvir...
Primeiros dias da primavera, de Salvador Dali
Mas há uma saída. E ela é coletiva.
Há que se voltar mais uma vez para o Real, para o mundo, para a história, para o homem. “A Modernidade acreditava na história”, diz o poeta Affonso Romano, mas a pós-modernidade é essa ausência de qualquer celebração utópica. O mundo se transformou num grande mercado, ele acrescenta. Os movimentos transformadores do mundo são hoje desmoralizados e desmerecidos. Hoje não se incentiva o agrupamento, a coletividade. A noção de História se encontra confusa, assim como a noção de realidade objetiva tornou-se “suspeita”. O nevoeiro se espalhou por toda parte.


E alcançou até a arte. De tão nebulosa, ela nem precisa ser vista, basta crer, basta ter fé na intenção do artista e pronto. A Arte existe, se é discurso.
Mas, no entanto a Terra se move, como disse Galileu Galilei lá pelos idos de 1615...
E a nós, nos resta engendrar a subversão que porá tudo de pernas pro ar, “quando o tempo for propício”...
(Trecho de oração ao Tempo, Caetano Velloso)

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Preparando a primavera

Les Nymphéas, de Claude Monet, 1920-1926, óleo sobre tela, 602x219cm, Museu de l'Orangerie, Paris
As torrentes e os rios degelam de repente
Primavera em fulgor ressurge sem tardança!
No campo aflora em tudo alegria e esperança
enquanto o velho inverno, extênue e decadente
às ásperas montanhas se recolhe e lança
com os estertores finais, nos ares regelados
granizo em profusão que toda a terra envolve.
Cobrem-se verdejantes e distantes prados
com branca e pura neve e o sol logo a dissolve
tudo renasce e vibra com força e fantasia
Natureza rebenta em cores e poesia
E como nesse campo existem poucas flores
Enfeita-se com vestes humanas multicores.

Contempla desta altura a toda imensidade
e observa ao longe em direção à cidade
do vão da porta escura, em grande confusão
surge uma colorida e ávida multidão
Todos querem o calor do sol com ansiedade...
(...)
(O Fausto, de Goethe)

E eu vou, por aqui, preparando-me para uma primavera interrompida por um outono, que virá em poucos dias... Interrompendo a estação das flores, vou subindo para o norte hemisférico em busca das cores. Um frio um tanto a mais, mas o aquecimento interno que eu preciso. Cá embaixo, ao sul do equador, as flores estão chegando. Lá em cima, ao norte, cores me apontam novos rumos. Moças com brincos de pérola me indicam um mergulho em tubos de tinta e em pinceis de marta e mangouste que atravessarão as minhas mãos. Vou me banhar com aquelas cores seculares e profundas. Eu volto.

Monet pintando à beira da floresta, tela de John Singer Sargent, pintor realista, 1885

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Hokusai, o “louco do desenho”

No último dia 26 de agosto de 2011 aconteceu em Berlim, Alemanha, a abertura oficial da exposição de 440 obras do mestre da xilogravura japonesa, Hatsushika Hokusai (1760-1849). A mostra terá a duração de dez semanas, indo até 24 de outubro, no Museu Martin Gropius Bau de Berlim. Muitos dos trabalhos lá expostos saíram do Japão pela primeira vez e, organizada cronologicamente, mostra todas as fases da carreira do artista.


Vista do monte Fuji com o dragão
Hatsushika Hokusai inspirou artistas como Van Gogh, Manet e Monet. Gustav Klimt, Degas e Gauguin colecionavam obras do mestre japonês, que morreu pobre, quase aos 90 anos, em sua cidade natal Edo – hoje Tóquio.

Hokusai nasceu na zona rural, uma região chamada de Katsushika, perto da hoje cidade de Tóquio, entre outubro e novembro de 1760. Seus pais não são conhecidos. Ele foi adotado por uma família de artesãos quando tinha entre 3 ou 4 anos de idade. Seu pai adotivo, Nakajima, era um fabricante de espelhos para a corte do Shogun. Desde cedo, Hokusai demonstrou facilidade para o desenho e a pintura.

Com a idade de 13 anos, torna-se aluno de um atelier de xilogravura e em 1778 começa a fazer parte do atelier do mestre Katsukawa Shunsho (1726-1792) que era, entre outras coisas, especialista em retratos. Hokusai começa nesse atelier seu trabalho de desenhista e de ilustrador de estampas. Após a morte do mestre, ele deixa o atelier.

Mas ele vivia em extrema pobreza. Mesmo assim, se dedicou a estudar as técnicas das escolas mais conhecidas da sua época, como a de Sumiyoshi Naiki, por exemplo. Também conheceu a arte praticada no Ocidente através de um artista japonês (Shiba Kokan) que costumava observar os pintores holandeses. Hokusai descobre a perspectiva.


Pintura de cerca de 1830
Por volta de 1794 ele se torna aluno de uma escola clássica japonesa, da tradição Rimpa. Faz muitas ilustrações e produz um grande número de desenhos e de estampas. Nessa época ele adota pela primeira vez o nome de Hokusai e ele mesmo se autodenomina, a partir de 1800, “O louco do desenho”. Em 1804 ele pinta, no templo de Edo (hoje Tóquio), com tinta nankin, uma tela gigante de 240 metros quadrados que para ser vista precisava ser içada até os tetos altos do templo.

Em 1812, Hokusai começa a percorrer seu país, fazendo croquis por onde passava, observando e anotando tudo em seus cadernos de desenho. Foram tantos os desenhos dessa fase que, quando mais tarde foram publicados em álbuns, o conjunto todo perfez 12 volumes.

Com 60 anos, Hokusai passa a se chamar Litsu, porque, dizia ele, estava entrando em nova fase da vida. Nesse período produziu muitas ilustrações de livros. A partir dos 60 anos, começou a desenhar mais paisagens, onde começou a usar a cor “azul da Prússia” que tanto inspirou o pintor holandês Vincent Van Gogh.

Ele teve, ao longo da vida, 30 pseudônimos – começou a usar Hokusai mais vezes a partir dos 70 anos de idade, fase que produziu as obras mais conhecidas. Desenvolvia sempre novos estilos e criou novas obras até o fim de sua vida, numa idade em que a maior parte dos artistas param de produzir.

Por volta de 1836, depois de uma longa temporada ausente de Edo, Hokusai volta à sua cidade. Mas a capital japonesa vivia um período de muita penúria, conhecido como o período da “Grande Fome”. Hokusai sobrevive graças a seus desenhos, que ele trocava por comida. Em 1839, um incêndio destruiu seu atelier, queimando o trabalho acumulado de anos!


O sonho da mulher do pescador - Hokusai
Os dez anos que se seguiram foram de produção mais lenta, mas Hokusai se esforçava por fazer pelo menos um desenho por dia, coisa que ele fez até o último dia de vida. Ele morreu no dia 10 de maio de 1849, deixando uma obra com cerca de 30 mil desenhos e mais de 500 livros ilustrados. Seu corpo foi cremado e suas cinzas depositadas dentro do templo que fica na região onde ele passou a maior parte de sua vida.

Sobre a caixa que contem suas cinzas, há um epitáfio que ele mesmo escreveu: “Oh! Liberdade, Liberdade bela! Quando será que iremos aos campos do verão para deixar lá nossos corpos perecíveis?”

Conta-se que em seu leito de morte, Hokusai teria dito: “Se eu tivesse mais cinco anos de vida, teria sido um grande artista!”

Para mim, Hokusai representa o artista persistente, aquele resistente solitário, o que continua praticando sua arte sem jamais se entregar, mesmo que para isso faça algum sacrifício pessoal. Representa também aquele artista que está aberto ao aprendizado em qualquer fase de sua vida, sempre buscando descobrir novas formas de criar, sempre buscando se superar e enxergar formas novas no real, que não se esgota!


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A grande onda fora da costa de Kanagawa, cerca de 1831, Hokusai

Vista do Monte Fuji em vermelho, cerca de 1830